terça-feira, 13 de outubro de 2015

Respire

(França, 2014) Direção: Mélanie Laurente. Com Joséphine Japy, Lou de Laâge, Isabelle Carré


Por João Paulo Barreto

Apesar de seu título simbólico e ligado mais a um significado subliminar da trama do que propriamente ao desenvolvimento gradativo de seus personagens e desfecho pretensamente chocante, Respire, obra francesa exibida na Semana da Crítica de Cannes em 2015, traz uma discussão mais importante para os dias atuais que é a questão do bullying entre adolescentes e o modo como tais perseguições podem abalar alguns deles tanto de forma psicológica quanto física.

Na trama, a adolescente francesa Charlene, ou Charlie, como é chamada por todos, é uma estudante secundarista com problemas de asma e jovens pais em constante conflito. Charlie percebe em uma aluna novata, a confiante e quase rebelde Sarah, uma reconfortante e calorosa amizade que se desenvolve desde seu primeiro encontro no colégio, passando a crescer ainda mais nos momentos em que estão juntas durante estudos em casa e férias passadas com a família da primeira

Cumplicidade: Charlie e Sarah se envolvem cada vez mais
Com claros desejos sexuais reprimidos pela amiga e uma fragilidade afetiva gritante, Charlie se vê refém das nuances da personalidade de Sarah, que, inicialmente companheira e presente, passa a criar joguinhos psicológicos com a amiga, como quando passa a ignorá-la durante o tempo que passam juntas nas férias familiares de Charlie apenas porque esta a apresentou como colega de colégio ao invés de amiga.

Sarah, no entanto, esconde segredos relacionados a sua mãe, que ela vende aos amigos como sendo uma ativista de uma ONG da África, mas, na verdade, é uma alcoólatra desequilibrada que vive em seu minúsculo apartamento sob os cuidados da filha. Notável o modo como a diretora Mélanie Laurent (a Shosanna, de Bastardos Inglórios) traz ao espectador esse segredo da vida da espevitada Sarah. Mantendo um eixo horizontal de câmera, ela exibe pelo lado de fora o sujo apartamento onde a adolescente vive, mostrando através das janelas o drama da vida doméstica da jovem e, finalmente, alcançando a revelação de uma terceira pessoa a presenciar aquilo, o que trará consequências drásticas na vida das protagonistas.

Evitando focar na evidente sensualidade das duas meninas, Laurent acerta em manter a relação afetiva com o mínimo de apelo sexual, algo que seria uma armadilha fácil para o roteiro seguir, principalmente após o sucesso de Azul é a cor mais Quente.

Sempre juntas, a amizade deixa o colégio para fazer parte da vida de ambas
Ao invés de escancarar qualquer desejo reprimido que ambas possam possuir, o roteiro, baseado na obra de Anne-Sophie Brasme e escrito pela diretora em parceria com Julien Lambroschini, mantém tal possibilidade no campo da sugestão, colocando-o apenas nos olhares de Charlie para a amiga, na observação desta enquanto Sarah está na aula de ginástica e alcançando o “máximo” ao colocá-las em um beijo bêbado durante uma brincadeira.

Outro ponto curioso é o modo como a beleza de Charlie é apresentada ao espectador em sua primeira aparição em tela, quando, após um breve momento com o rosto encoberto por uma xícara no café da manhã, exibe sua jovialidade e exuberância, características essas que a garota não parece perceber possuir e, quando tenta salientá-las com um simples batom, o resultado acaba sendo o menos esperado e a constrangendo em sua.frágil solidão.

É uma obra que consegue dosar bem a tensão de uma relação cujo desequilíbrio trágico e emocional é iminente, o que não deixa de refletir de forma positivamente incômoda no espectador. Mesmo com um final um tanto forçado e criado com uma certa intenção de choque que beira o artificial, Respire se apresenta muito bem em sua proposta de discussão no modo como a adolescência pode ser uma fase extenuante, principalmente para jovens em situações de bullying.

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