terça-feira, 1 de setembro de 2020

Thiago Brandão - Estação Esperança

Foto: Geovana Côrtes

A Estação Esperança 
do músico Thiago Brandão


MÚSICA Gestando para breve primeiro álbum, exímio e notório baterista mostra nova faceta de violonista, cantor e compositor em segundo single e videoclipe do projeto “em ti me dar”

Por João Paulo Barreto

Quem conhece a cena rocker de Salvador, já se deparou com as pancadas poderosas e, também, sutis de Thiago Brandão na bateria de bandas como as atuais Eric Assmar Trio, Cavern Beatles e, até 2016, com a Lo Han. Na sua trajetória com as baquetas, o jovem músico ajudou a criar nas bandas citadas uma unicidade potente, construindo em conjunto uma evolução palpável tanto em shows repletos de energia, quanto em discos singulares como o “Morning”, segundo álbum da Eric Assmar Trio, e o “Get High”, primeiro trabalho da Lo Han. Além disso, em paralelo a esse crescimento técnico e musical como baterista, Thiago também tem em sua trajetória um consistente trabalho como compositor por trás do violão e guitarra, bem como nos vocais.

Lançando em 2020 o projeto “em ti me dar”, o músico divulgou nesse mês de julho o vídeoclpe de “Estação Esperança”, faixa com pegada folk e texto reflexivo acerca de um futuro incerto, combalido pelo nosso atual presente, mas sem perder a utópica esperança de seu título. Trata-se de uma música cuja junção da letra com as imagens de seu videoclipe trazem essa análise do presente em seu cerne.  “Dependendo de como você interpreta [a letra], acaba que parece que eu estou sugerindo que ‘utopia é o que nos resta para viver e uma voz que traga sentido para tudo de novo.’ Mas eu estou muito mais citando essa visão das pessoas que parecem que se perdem nisso. Em vez de tentar ouvir umas às outras e buscar uma voz que seja comum, não, tem que ter uma voz de cima que meio que obrigue aos outros a seguir sempre essa voz. Isso me incomoda muito”, explica Thiago acerca da faixa que conta com sua produção e mixagem, e com a guitarra de Eric Assmar e o baixo de Vitor Magalhães.

Arte visual de divulgação do clipe de "O Irresponsável", lançada em março

Com essa segunda faixa a trazer tal reflexão (a primeira, “O Irresponsável”, lançada em março, possui em sua letra e imagens de videoclipe um recado mais direto quanto ao caos político que nos cerca), o músico reflete sobre esse estilo de criação. “É uma marca das minhas composições. Geralmente, elas partem de incômodos assim. E quando eu vi que esse era um caminho possível para essa letra, eu investi muito nesse lado. De trazer esses incômodos e, ao mesmo tempo, de mostrar um caminho que não precisa ser por aí”, contextualiza.

ORIGENS RÍTMICAS

Tendo tido a bateria como primeiro instrumento de expressão, o músico reflete acerca dessa variação em seu propósito artístico de criação. “O primeiro instrumento musical que eu senti em mim foi o meu próprio corpo. Batucando na minha perna, no meu peito. Essa coisa do ritmo, da baianidade. Eu sinto muito isso em mim. Eu cresci no Candeal, e, nessa época, ainda tinham os ensaios em que o pessoal ficava subindo e descendo ladeira tocando timbal. Isso formou muito, aguçou muito a minha noção rítmica. As pessoas que conviveram comigo quando eu era criança têm essa cena clássica: eu batucando na mesa, batucando na perna ou batucando onde eu estivesse”, relembra Thiago.

O início do contato com a bateria ainda na infância permitiu ao músico, no passar dos anos, um acúmulo técnico dentro do rock como estilo escolhido de expressão do instrumento, mas sempre tendo o violão como outro modo de criar. “A figura de Dave Grohl me mostrou esse caminho. O primeiro cara que eu queria ser foi o Dave Grohl. Depois vieram outros ícones da década de 1990. Eu tenho 33 anos e vivi essas realidades das primeiras figuras que marcaram o gosto musical nos anos noventa. Mas, paralelo a isso, eu estava sempre percebendo que o violão era o que reunia mais as pessoas. E, volta e meia, o amigo que estava ali tocando comigo na banda, aos 15 anos de idade, ou da banda que já estava semi-profissional, estavam me ensinando. E eu sempre fui um cara que absorve muita coisa facilmente. Essa amizade com o violão foi surgindo aos poucos. Foi mais lenta. A parte rítmica, da bateria, sempre foi muito forte”, salienta.

No confinamento necessário: faixa "Estação Esperança" gravada remotamente

AUDIOVISUAL

Thiago Brandão, além de músico, é também videomaker e montador, trabalhando na criação dos próprios clipes, como é o caso dos recentes lançamentos do projeto “em ti me dar”, bem como com o Eric Assmar Trio, no qual montou e finalizou o clipe da faixa “Morning”, abertura do disco homônimo lançado em 2016. Com experiência em trabalhos na publicidade e cinema (foi da equipe de montagem de documentários sobre Augusto Omolú e Rogério Duarte), Thiago tem no audiovisual uma maneira a mais de expressar sua música e buscar fazer essa diferença dando voz e imagem a causas pouco vistas. “[Trabalhar no doc sobre Omolú] foi um aprendizado extremo e, para além da técnica do editar, de como existem pessoas invisibilizadas hoje e que precisam ter essa voz através de um documentário. Nessa primeira experiência, eu percebi que o fazer documentários é uma coisa que eu quero levar para minha vida nesse sentido de poder trabalhar valorizando ou dando vida a questões que, às vezes, a televisão não dá, ou então ainda não deram evidência. Como era o caso de trabalhos como os de Augusto Omolú”, pontua. 

Na relação entre sua música e trabalho com audiovisual, Thiago é preciso ao salientar essa importância. “Sinto-me assim na obrigação de contar histórias, mas não é qualquer tipo de história. É uma história que eu me sinta parte. Mesmo distante fisicamente, mas que eu me encontre. Isso tem tudo a ver com “Estação Esperança”. É a tal da utopia. Eu me sinto parte dessa utopia e tento trazer isso para as outras pessoas. É uma das maneiras de eu me sentir vivo em momentos tão estranhos”, finaliza.
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*Texto originalmente publicado no
Jornal A Tarde, dia 02/09/2020








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