sexta-feira, 7 de junho de 2019

X Men: Dark Phoenix



Fênix sem brilho


Ao não ousar em seu capítulo final, franquia dos X-Men 
decepciona em despedida com obra simplória e formulaica

Por João Paulo Barreto

Resumir a criação dos X-Men tanto nos quadrinhos da Marvel Comics quanto nas suas adaptações para o cinema como simples aventuras maniqueístas de super-heróis contra vilões com ímpetos de dominação mundial é soar bastante reducionista. Tendo sua gênese baseada nos escritos e desenhos oriundos das mentes de Stan Lee e Jack Kirby nos anos 1960, período no qual questões políticas voltadas para discussões raciais eram evidentes, e o pensamento de nomes como os de Malcolm X e Martin Luther King dividia grupos de suporte às causas, os dois autores inseriram em seus personagens mutantes dramas que se assemelhavam aos mesmos que se evidenciavam e se agravavam a cada dia nos Estados Unidos de então (e nos de hoje, com um xenofóbico racista ocupando a Casa Branca, ainda mais). 

Seus antagonistas principais, inclusive, eram variações dos dois líderes negros de então, sendo Charles Xavier uma representação da paz sem violência pregada pelo Dr. King e Eric Lehnsherr, o Magneto, um espelho do direito de defesa através do uso da “inteligência pela violência” que Malcolm X pregava. Assim, quadrinhos que pareciam simplistas em seus arcos originais de então (convenhamos, eram um tanto simplistas em certos pontos de suas narrativas, de fato), escondiam uma discussão muito maior que ilustrava a importância de se discutir o racismo como uma chaga aberta na sociedade.

Sophie Turner: limitações dramáticas não colaboram para um aprofundar da personagem

Porém, a discussão social dentro dos quadrinhos dos X-Men só se tornou mais palpável a partir do momento em que nomes como os de John Byrne e Chris Claremont assumiram seu título nos anos 1970, e seguiram durante a década seguinte, quando histórias como Deus Ama, O Homem Mata, que serviu como pano de fundo para o filme de 2003; Dias de um Futuro Esquecido, também adaptada para o cinema; e A Saga da Fênix Negra¸que agora chega às telas, foram escritas. Em seu material original, a dosagem exata de um drama social e político acerca da aceitação e da tolerância dentro de um universo fantasioso de super-heróis, ajudava a criar para os jovens leitores uma noção precisa do fato de que tinham em mãos, apesar de sua aparência ingênua de gibi, um denso retrato da sociedade em que viviam.

Assim, ao se valer dessa base narrativa, os produtores da franquia cinematográfica conseguiram, no decorrer de quase vinte anos, construir, entre acertos bem vindos e erros grotescos, uma série de obras que, apesar de sua irregularidade, primava por deixar claro essa discussão tão bem inserida nas páginas originais dos quadrinhos. Uma pena que um desses erros tenha sido apresentado justamente no último exemplar sob a alçada da 20th Century Fox (os direitos para o cinema foram adquiridos pela Disney/Marvel Studios, que reformulará toda a franquia).

TERRENO RASO    

Utilizando um roteiro que peca, em parte, pelo não desenvolvimento de sua protagonista (Jean Grey, a Fênix Negra do título, vivida por Sophie Turner), o filme escrito e dirigido por Simon Kinberg, roteirista de outros exemplares da série, insere seus conflitos dentro de uma proposta bem idealizada, com a premissa de uma descoberta de rejeição atrelada a um trauma de infância que ressurge na fase adulta de forma furiosa. Desenvolvendo sua personalidade maligna representada pela entidade Fênix com bem vinda fidelidade à história em quadrinhos original - na qual também vemos a origem da entidade através de uma suposta tempestade solar-, o impacto de sua aura vil pode até não alcançar o nível emocional merecido (Turner se esforça, mas o pouco tempo e sua limitações dramáticas não permitem muito àquele desenvolvimento), mas nada se compara em termos de superficialidade e preguiça autoral à escolha do bando de alienígenas como sendo os antagonistas que seguem no encalço da mutante.

Jessica Chastain mau aproveitada em personagem de diálogos expositivos e sem aprofudamento

Vivida por uma desperdiçada Jessica Chastain, a figura da alien que surge como líder de um grupo de transmorfos a assumir a forma humana e perseguir Jean Grey em busca do seu poder, denota justamente a proposta de uma obra reducionista e simplória abordada no inicio dessa crítica. A partir do momento que a ideia de adentrar mais uma vez em um bem desgastado território que já havia sido trazida para as telas em outras nove produções (contando com o primor Logan, de 2017), caberia ao desenrolar desse antagonismo uma abordagem mais aprofundada dentro das possibilidades que os temas que a saga dos X-Men é capaz de alcançar. Principalmente sendo este o capítulo final.

No entanto, o que vemos é uma repetição de perseguições em momentos que, apesar de visualmente impactantes (os efeitos especiais são muito eficientes, juntamente à trilha sonora do mestre Hans Zimmer), carece de algo além de apenas lutas, tiros e curas instantâneas em uma aventura cujas tentativas de oferecer momentos trágicos não geram o impacto planejado à trama. Assim, quando importante personagem morre, o que causa ao espectador não é choque, mas, sim, a percepção de que aquilo soou mais como uma exigência por parte de seu interprete. Fica apenas o desdém.

Sim, já houve discussões mais densas em outros exemplares da franquia, mas resumir o filme de despedida a um mero jogo entre vilões e heróis sem muito a oferecer além de pancadaria é algo que decepciona dentro de uma série que teve mais altos que baixos. Torcer pelo que a Disney/Marvel Studios fará com tão amados personagens dos quadrinhos.


*Texto originalmente publicado no Jornal A Tarde, dia 07/06/2017

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