sábado, 8 de junho de 2019

Escorpião - Teatro/Filme


Escorpião – Texto de Felipe Greco. Encenação de Marcus Lobo. Com Duda Woyda e Gleison Richelle.



Por João Paulo Barreto

Na junção entre cinema e teatro que Escorpião, em cartaz até amanhã no Teatro Vila Velha, uma instigante maneira de observar como essas duas artes são capazes de se mesclar. Dentro de uma proposta que aborda o aspecto diegético do cinema, no qual imagem e som reais de um tablado reverberam para dentro da tela que projeta imagens fílmicas de sua narrativa, o texto de Felipe Greco, juntamente com a encenação de Marcus Lobo, ganha uma força tremenda. Ao abordar a violência do pretenso macho dominador, inseguro em sua paranóia, mas repleto de uma truculência típica, somos levados a um roteiro de vingança que provoca o espectador de maneira a lhe colocar diante de uma reflexão que, infelizmente, se torna a cada dia mais evidente no Brasil de 2019.

A ideia de colocar seus protagonistas em uma constante interação entre teatro e cinema, no qual a projeção utiliza o próprio palco como um exercício de quebra da quarta parede, concede a essa montagem possibilidades imensas. Em certo momento, por exemplo, uma alucinação contida, obviamente, apenas na mente de seu protagonista se desenha diante dos olhos do público a partir de uma projeção. Ambos se confrontam e este é não somente um dos símbolos dessa simbiose entre as duas artes, mas uma percepção de como a ilustração e já citada mescla entre ambas se equilibram de maneira eficiente.  

Na história de um assassinato, fuga, esconderijo, cativeiro físico e mental e entrega física e emocional entre dois protagonistas, uma desconstrução de ambos é apresentada gradativamente ao público presente. No constante trocar de roupas sujas, não é apenas a imundice física que a presença agressiva de Boris (Duda Woyda) se faz notar, mas, também, uma constante (e inútil) tentativa de se purificar. Mas, curiosamente, a insistência para que este se troque, se cuide, se alimente, parte de Edu (Gleison Richelle), que, ao final, se demonstra como uma forma não só de proteção, mas de manipulação. Aqui, o nome do espetáculo remete não somente a uma tatuagem ou a um apelido, mas a uma característica animal, que, no final, revelará sua verdadeira natureza.

Remetendo às clássicas obras da Boca do Lixo, Escorpião é pungente como seu próprio nome entrega. Na continuação e desfecho que o espectador encontra ao assistir ao curta metragem indicado como sequência do espetáculo, um pouco dessa ambientação que nos leva a Carlão Reichenbach, Andrea Tonacci e o cinema da Boca.

Aqui, uma obra que instiga por sua violência a nos levar a uma reflexão. Que nos provoca por sua crueza física. Mas que traz uma análise precisa dessa mesma violência como modo pernicioso e nocivo de dominação.

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