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As sócias Tatti Carvalho, Andrea Gama e Sofia Federico |
Com
experiência no âmbito do curta metragem, na direção de obras como Cega Seca (2003), quando foi indicada ao
prêmio da Academia Brasileira de Cinema, Caçadores
de Saci (2005), Vermelho Rubro do Céu
da Boca (2005) e Navegantes (2015),
a também roteirista Sofia
Federico inicia a produção de seu primeiro longa, Tempo Meio Azul Piscina, projeto
realizado pela Benditas Projetos Criativos
, produtora baiana na qual atua, também, como sócia. O projeto em
desenvolvimento foi um dos vinte selecionados para a nona edição do CineMundi,
encontro de profissionais do audiovisual de diversas partes do mundo que,
durante a Mostra CineBH 2018, estiveram em Belo Horizonte para conhecer e
estudar projetos visando a coprodução de
futuras parcerias de longa metragem. Junto a sua sócia na Benditas, a produtora
Tatti Carvalho, Sofia esteve na capital mineira para as mesas e encontros. O A
Tarde conversou com as duas profissionais acerca dessa incursão no âmbito dos
longas metragens, dificuldades no audiovisual diante de um cenário sem muito
suporte governamental na Bahia e sobre outros projetos da Benditas, Confira o
papo!
Sofia, este é seu primeiro longa. Desafio
grande. Do que trata Tempo Meio Azul Piscina?
SOFIA FEDERICO - O filme conta a história de
uma mulher, Zaila, de
35 anos. Ela mora em
Salvador e vive um luto, pois acaba de perder a filha no parto. Ela enfrenta o
luto com muita dificuldade. Trabalha em um museu, restaurando e recuperando
imagens, fotografias e postais da velha Salvador. Ao trabalhar com isso, ela
acaba fazendo muitas intervenções nessas fotos, nessas imagens, criando
uma nova realidade. Essa é a forma que ela encontrou de lidar com o luto.Nesse tempo em que ela está assim, lidando com a dor da
perda da filha, acaba tendo que acudir a vizinha, Hebe, uma pessoa que é sua
amiga próxima e que acabou de parir uma criança, um garoto. Essa amiga tem
muita dificuldade de cuidar da criança. Ama loucamente o bebê, mas tem
dificuldade de cuidar. Então, Zaila, que está louca para ser mãe, acaba se
oferecendo para ajudar e as duas criam uma relação de vínculo muito próximo. De
afeto e de interdependência. A história é sobre isso. Fala sobre essa força nas
relações humanas. E de como é necessário, em um processo de luto, você
encontrar uma maneira de sobreviver.De sair, cada um com uma forma. Essa é a
forma que Zaila encontrou. Criando uma realidade paralela, fantasiosa.
De onde vem o simbolismo do título?
SF - O azul é um estado da
protagonista. Um mood. Uma sensação
que vem do blue. Do estar nesse mood, nesse blue (do inglês, tristeza). E Azul
Piscina porque Zaila nada muito. Ela nada todos os dias na piscina.
Enquanto nada, ela chora e ninguém consegue ver que ela está chorando. E suas
lágrimas se misturam com a água. E essa piscina é o lugar onde a gente consegue
acessar o mundo interior dela. É uma narrativa muito plástica, visual, a ideia
é construir essa história assim. A gente acompanha a jornada dela, nessa
relação com o trabalho, em casa, com a vizinha, mas a gente também vai
conseguindo entender como é que ela está se mudando internamente. Uma mutação
dela que ocorre internamente, nesse estado liquefeito em que ela está. Em um
estado de água, um estado sem definição. Nessa busca de uma nova
identidade diante desse luto que enfrenta.
Já há algum nome escolhido para o elenco?
SF - Já temos alguns nomes no casting,
mas ainda não estamos divulgando. Isso porque ainda iremos realizar testes de elenco, sendo que há alguns nomes que queremos
convidar.
Essa vinda ao CineMundi, em BH, representa
muito por conta da possibilidade de encontros com potenciais parceiros de
diversas partes do mundo, não é?
SF - O fato de termos vindo aqui
para essa participação no CineMundi visa sobretudo a articulação internacional.
Esse encontro de co-produção internacional onde a gente de fato tem
possibilidades de realizar um primeiro contato para conseguir realizar uma
co-produção. Seja com uma produtora de outro país na América Latina ou na
Europa ou seja através de Fundos Internacionais que são aqui apresentados para
a gente e que podem nos ensinar alguns caminhos de como acessar recursos de
fora. Junto a isso, há a possibilidade
de conseguir atrair uma produtora internacional. Esse movimento nosso é
justamente pensando em captar o recurso, sim, mas, sobretudo, é colocar um projeto
dentro de uma plataforma, de uma rede internacional. A
gente acha isso muito importante para um projeto como o nosso, que está em um
estágio ainda bem inicial. Acabamos de fechar o roteiro e de levantar o projeto
executivo. É muito importante fazer já um caminho de conexões conhecendo
possíveis parceiros, financiadores. Mas, claro, a gente continua batalhando
para conseguir viabilizar a produção com recursos locais, tanto do governo do
estado, quanto do governo federal. No momento, a gente só encontra um caminho
que é o caminho do governo federal, principalmente através do FSA da
Ancine.
TATTI CARVALHO - O
Cine Mundi é uma iniciativa repleta de projetos. É algo muito competitivo. Os
projetos são incríveis. A curadoria foi muito certeira. São projetos muito
conectados com o tema, que são as Pontes Latino Americanas. Mas, para nós,
somente termos participado do evento, com todos os contatos que fizemos, já é uma premiação. Foram
muitas mesas de conversas com pessoas e instituições bem atuantes no mercado internacional. Foi algo muito importante para a
gente.
SF–Isso. É um evento muito bom
porque ele nos coloca em contato com essas pessoas que estão circulando
festivais do mundo todo e que são experts em financiamento internacional, em
co-produções internacionais, e são pessoas que conseguem, também, contribuir
para a gente deixar o projeto mais robusto. Eles nos dão muitas orientações
precisas, sugerindo destaques para pontos do projeto e que possamos dar ênfase
em alguma parte específica.
TC - E isso tanto no âmbito
conceitual quanto no de produção. Então, é contribuição para os dois lados do
projeto. Muito boa essa experiência.
O projeto já conta com a parceira da
Ancine, também?
SF - O projeto foi contemplado em
uma linha de desenvolvimento da Ancine. Uma linha muito boa chamada PRODAV IV.
Os PRODAVs da Ancine de desenvolvimento são o III, IV e V. Os PRODAVs III e V
permanecem nas linhas de desenvolvimento. O PRODAV IV ele não vai mais ser
lançado, pelo que foi anunciado. E é uma linha muito boa. Muito importante.
Porque é um combo. É uma linha em que, ao mesmo tempo que você está
desenvolvendo, você também tem laboratórios e oficinas de qualificação técnica.
Então, ao longo de um ano, houve laboratórios não somente para amparar na
dramaturgia, na escrita do roteiro, como também para ajudar a gente a erguer o
projeto no ponto de vista da produção. A gente saiu dessa experiência de um ano
com o projeto executivo levantado, pronto, e com o roteiro já escrito. Já
estamos na segunda versão do tratamento do roteiro.
O governo da Bahia não lança editais de
cultura para o audiovisual já faz um tempo. Recentemente, a APC (Associação de
Produtores e Cineastas da Bahia) publicou uma pertinente carta aberta destinada
ao governador Rui Costa questionando isso. Como produtoras, como vocês lidam
com essa falta de suporte? Quais as dificuldades, também, junto à Ancine e ao
Fundo Setorial?
SF - Está todo mundo buscando
recursos no Fundo Setorial do Audiovisual. E para a gente, dentro dessas novas
modalidades que surgiram aí, de avaliação dos projetos nas linhas de produção,
é muito difícil entrar. Porque há todo um ranking de notas, uma pontuação para
diretor, para produtora que faz performance em sala. É uma pontuação bem
pautada em cima de performance, algo que vai acabar beneficiando somente as
grandes produtoras. Não se considera, por exemplo, para modo de pontuação, quem
realizou curtas metragens. Quem fez um curta não pontua nada. Então, a gente
está buscando outros caminhos. Estamos
juntos à APC acompanhando toda a luta da associação. Não estamos na
linha de frente, mas a gente está acompanhando todo o movimento da APC porque,
também, fazemos parte da associação. Ela está atuando de uma forma bem
aguerrida. Fazendo esses questionamentos, indo lá, se apresentando e
questionando não somente a instância última que é o governador, mas também as
intermediárias. E agente acha que falta de fato um entendimento por parte do
governador. Eu não gostaria nem de falar isso nesse momento de eleições, esse
momento em que estamos tão frágeis. Mas a gente acha que a cultura poderia ser
vista como um setor estratégico.
TC- Falta essa visão em todas as
instâncias governamentais. Em nível federal, a gente está vivendo uma
insegurança terrível. Ainda temos a Ancine apresentando essas possibilidades,
mas estamos todos vivendo essa insegurança coletiva sem saber se isso vai
continuar. Em nível estadual, está essa inércia já faz algum tempo. Essa falta
de visão sobre a função estratégica da cultura e do audiovisual,
particularmente. E em nível local, municipal, a gente observa a prefeitura se
movimentar, mas, também, ainda a passos lentos e com poucos recursos. O que a
gente tem que fazer é continuar pressionando, mesmo. E encontrando esses novos
caminhos, como o do CineMundi, onde nos foi dada essa oportunidade. Estamos
muito felizes por termos sidos selecionadas, como um dos
vinte projetos no Brasil inteiro, dentro de mais de 140 que foram
inscritos. Essa é a
busca desses caminhos alternativos.
SF - Dentro ainda dos incentivos
do governo estadual, é importante destacar que, ao menos, temos a TV Pública,
através do IRDEB (Instituto de Radiodifusão Educadora da Bahia), incentivando e
estimulando a produção audiovisual. Mas não no formato longa metragem. É um
formato visando apenas a programação da grade da TV Educativa (TVE). Produção
de seriados, documentários, os telefilmes, então, dentro da instância
governamental, do estado, essa ação do IRDEB é muito importante e precisa ser
continuada e atualizada, como já vemos acontecer em Pernambuco. No caso, lá, é
a Secretaria de Cultura de Pernambuco que vem a cada ano só aumentando os
investimentos na produção audiovisual e, inclusive, no cinema.
TC – Lá, eles enxergam a cultura
como algo estratégico.
Tatti, você poderia falar um pouco da
Benditas e de sua proposta de atuação?
TC - Eu e Sofia já nos
conhecemos há bastante tempo. Trabalhei com ela durante sua gestão na DIMAS (Diretoria de Audiovisual da Bahia), então, já
tem mais de dez anos que a gente trabalha juntas. E quando saímos da gestão
pública, resolvemos nos unir e criamos a produtora. A Benditas nasceu em 2013.
Vamos fazer cinco anos. Ainda é uma produtora jovem, mas que traz na sua equipe
pessoas já com experiência no setor audiovisual. Temos duas vertentes muito
fortes como foco de atuação da empresa. Uma é a produção de conteúdos
audiovisuais qualificados. Para TV, a gente tem feito séries e documentários.
Agora, estamos investindo nesse primeiro projeto de longa metragem. Temos
investido bastante, também, em formação,
qualificação para o setor da economia criativa. Mas estamos com um olhar muito
cuidadoso e com mais atenção ao setor audiovisual porque a gente sabe que
existe uma demanda muito grande no mercado. Apesar de todas essas dificuldades,
o mercado audiovisual tem crescido quase 10% ao ano, no Brasil. Isso por conta
das leis de incentivo, da TV paga e por conta de todas a políticas públicas que
foram implementadas na era Gil e Lula que só fortaleceu esse setor, como, por exemplo, a
criação da ANCINE. Nós temos observado muitas oportunidades de qualificação
nessa área. Desde 2014, a gente vem oferecendo tais qualificações na empresa,
também. Essa área, na produtora, vem se fortalecendo cada vez mais.
Tatti, quais os projetos que você poderia
destacar na Benditas?
TC - Estamos finalizando, em
parceria associada com a produtora DocDoma, duas séries infantis para TV: Francisco só quer jogar bola e Tabuh!. São projetos da DocDoma que foram contemplados nos editais do IRDEB e da FGM (Fundação
Gregório de Matos).Estamos também em fase de desenvolvimento e
preparação de duas novas séries nossas - uma infanto-juvenil e a outra documental, que
vamos rodar no ano que vem. No final de 2018, a
gente já começa a pré produção da série infanto-juvenil, que tem cinco episódios de 13
minutos. É um projeto com roteiro e direção de Sofia e que trata de uma questão
muito importante, principalmente em tempos tão áridos, que é a necessidade de
diálogo. O nome do projeto é Pequeno
Tratado de Pequenas Coisas.
SF – Isso. A série traz uma
indígena como protagonista. Ela mora em área urbana, uma grande cidade, mas
cresceu na sua aldeia. Na cidade, todos os problemas do mundo parecem estar ao
redor de sua casa. E aí a forma como ela encontra para resolver esses problemas
é justamente o diálogo. Essa é a sinopse. São cinco episódios de 13 minutos
cada, sendo que cada um deles tem um história específica e independente.
TC – A outra série, documental, será rodada no próximo ano e fala sobre a história da
travessia Mar Grande - Salvador. Uma travessia histórica, de mais de mais de
cinquenta anos.
Para conhecer mais a
produtora, acesse: benditas.art.br.
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