(The Accountant, EUA, 2016) Direção:
Gavin O´Connor. Com Ben Affleck, Anna Kendrick, J.K. Simmons, Jon Bernthal.
Por João
Paulo Barreto
Notoriamente visto como um ator limitado em suas
performances dramáticas, Ben Affleck se revelou um dos melhores diretores de
sua geração. Medo da Verdade, Atração
Perigosa mostraram uma energia em seu modo de direção que alcançou com Argo, o vencedor do Oscar de melhor
filme em 2013, uma maturidade primorosa na criação de thrillers.
No entanto, o galã ainda se arrisca a criar personagens
baseados em seu modo soturno de atuação, como vimos no próprio Argo, sob a batuta de David Fincher em Garota
Exemplar, e, contrariando muitas previsões pessimistas, acabou se revelando um
excelente Batman na ultima encarnação do herói nos cinemas. Em O Contador, esse modo automático de
atuar, sem muita necessidade de expressões dramáticas ou exigências nessa
linha, se adéqua perfeitamente para seu personagem, aqui, dirigido por Gavin
O´Connor, do ótimo Guerreiro.
Affleck vive Christian Wolff, um contador profissional que
atua sob a fachada de um simples profissional do ramo, mas que, na verdade,
gere os livros de caixa de diversos criminosos de alto escalão em vários
países. Com uma infância traumática por conta de seu autismo e funções
cognitivas fora do normal, é treinado por seu pai militar para usar sua
inteligência em paralelo ao domínio físico. E é justamente nessa junção de
opostos que o roteiro de Bill Dubuque acerta.
Escrever sobre o vidro: exigência para gênios |
Há um equilíbrio visto na presença de Wolff em cena, o que é
auxiliado bastante pelo modo frio de atuação de Affleck. O calculado modo de se
movimentar, a rotina inabalável, o comportamento antissocial (algo visto em um
engraçado momento quando ele rejeita encontrar-se com a filha de uma
funcionária), as refeições exatas, o número preciso de talheres em casa, enfim,
tudo mantém sua postura de acordo com seu transtorno obsessivo compulsivo e com
os passos planejados que costuma dar para que seu disfarce não seja descoberto.
Ao ser contratado para descobrir as razões de um vazamento
financeiro nos livros de uma grande indústria robótica, esse equilíbrio começa a
desabar, algo perceptível pelo modo como se aproxima da também contadora Dana
Cummings (Anna Kendrick) e tem sua barreira antissocial derrubada pela
naturalidade da bela garota. Nesse ponto, com o TOC por não poder encerrar sua
tarefa a torturá-lo, é curioso observar como O´Connor insere pequenas pistas
daquele desequilíbrio, quando, por exemplo, a entrada de Christian com seu
carro na garagem deixa de ser precisa com o tempo do portão eletrônico, ou, de
forma mais escancarada, quando um ritual diário envolvendo música pesada, luzes
piscantes e um bastão ganha contornos mais violentos.
A presença autoritária de J.K. Simmons |
O filme acerta por se manter dentro de uma atmosfera de mistério
na caça que o FBI, representado pela sempre eficiente presença autoritária de
J.K. Simmons, realiza contra Wolff. Inserindo a figura de Jon Bernthal (cada
vez mais a vontade em papéis violentos) como contraponto para o pragmatismo de
Christian, há nesse embate uma química que funciona bem, principalmente nos
momentos em que as armas de grosso calibre, auxiliadas por um desenho de som
impactante (algo que remete ao clássico Fogo
contra Fogo), trazem o choque da violência que o protagonista carrega
consigo.
Encontrando o equilíbrio psicológico ao observar um original
de Jackson Pollock fixado acima de sua cama, a pintura de linhas
expressionistas representa bem o estado emocional e atormentado do contador. E,
pelo menos aqui, há a justificativa da falta de espaço para colocá-lo
escrevendo sobre o vidro, um já batido símbolo que o cinema usa para denotar
genialidade.
Uma pena que a necessidade redentora e familiar do roteiro
tenha falado mais alto, precisando inserir um laço não muito eficiente na
história de vida do protagonista como forma a tornar mais maleável seu final
escapista.
Ainda assim, um filme eficiente em seu tom hermético e de
violência precisa.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPostei com uma conta antiga logo acima, mas gostei muito do que você escreveu.
ResponderExcluirAmei sua resenha e é basicamente tudo que eu pensei após ter visto o filme. Discordo sobre o final escapista, apesar de tê-lo achado muito simples também. Achei o filme genial em todo seu desenvolvimento. Só pecou um pouquinho no final.
ResponderExcluirwww.cantaremverso.blogspot.com.br
Sou um aficionado da sétima arte, do tipo que repara em tudo desde o roteiro, a trilha sonora e as atuações. E desde que o Ben Afleck foi ironizado no papel do demolidor - pois a culpa do filme ser um fracasso, não foi devido à atuação dele e sim do contexto todo em volta da produção, (pensando nele como ator). Eu sempre acreditei que ele ia dar a volta por cima. Depois veio aquela situação humilhante que ele viveu quando foi indicado para ser o novo Batman, eu n tinha dúvidas que ele seria perfeito no papel... Bom e sobre esse filme, foi perfeito para ele... a atuação, as expressões, o roteiro... e sem contar também os outros atores que fizeram muito bem os seus papéis, simplesmente adorei o filme !
ResponderExcluir