(Paris Pieds Nus, França, 2016) Direção: Dominique Abel e Fiona Gordon. Com Emmanuelle Riva, Pierre Richard.
Por João Paulo Barreto
É na ingenuidade e leveza que se baseia o cinema proposto
pelo casal de cineastas Fiona Gordon e Dominique Abel no divertido Perdidos em Paris. Tal proposta, algo
por demais bem vindo em tempos de um cinema feito com base quase exclusiva em
uma abordagem cínica, apesar de não ser uma constante na filmografia dos
realizadores, encontra um tom preciso na ideia de contar sua história a partir
da linha tênue entre o burlesco e o absurdo. Entre o cômico e o teatral.
Na visita da canadense Fiona (vivida pela própria diretora)
a Paris no intuito de buscar sua tia senil e, então, desaparecida, a desculpa
para as situações nonsenses é plantada, e o desenvolvimento da história segue a
partir dessa premissa, a de caminhar entre momentos nos quais o espectador é
colocado diante de uma série de eventos que brincam com a linearidade da
montagem para liberar as pistas do que realmente aconteceu. Nessa construção de
acontecimentos, algo que não subestima a inteligência do espectador justamente
por conta da complexidade da escolha de seus cortes e nas inserções seguintes
para tornar fluída a narrativa dentro de sua comicidade, o desenrolar da trama
é apresentado de forma, contrário de como seria de se esperar, não estabanada
ou tentando arrancar gargalhadas do espectador. A forma, aqui, é mais natural,
dando ao público a chance de degustar cada traquinagem e gags visuais, cada
colagem de pistas e, o mais importante, observar os maneirismos físicos de seus
dois protagonistas, no caso, o segundo vivido pelo próprio Abel na presença de
um mendigo oportunista, mas abalado pela solidão.
Um dos últimos trabalhos da atriz Emmanuelle Riva |
E neste sentido, Dominique e FIona, dentro de seus
personagens homônimos, se engrandecem. E cada momento dos dois em cena, com
suas reações estupefatas aos acontecimentos ao seu redor, mas sem se render a
caras, gritos e bocas para causar uma graça rasteira, é uma lembrança à platéia
de que estamos diante de uma obra cujo único compromisso é o de causar sorrisos
sinceros. Sejam eles oriundos dos momentos que utilizam um engenhoso
planejamento de montagem em busca da comicidade, ou quando preferem apenas
saudar a comédia musical francesa ao inserir breves participações como a do
ícone Pierre Richard, que, em cena ao lado de Emmanuelle Riva, tem um tenro
momento de dança que remete aos clássicos números musicais dirigidos por
Jacques Demy, mas, aqui, sem canto.
E, já que o nome da grande dama, Emmanuelle Riva, veio à
tona, é importante salientar esse que representou um dos seus últimos momentos
em vida. Aqui, ela parece se divertir de maneira única, com cenas de beijo,
fugas da polícia, sexo casual e dança. Após construir toda sua longa carreira
em papéis marcados por um peso dramático em suas atuações através de parcerias
como as feitas com Resnais, Pontecorvo, Melville e, mais recentemente, Haneke,
é bonito observá-la se despedir de modo tão leve, tão descompromissado, um
presente inesperado na final da carreira para alguém que viria a falecer poucos
meses após terminar as gravações.
A sensação de quem sai da sala ao passar menos de noventa
minutos diante daquela homenagem a nomes como Chaplin, Buster Keaton e Jacques
Tati é a da mesma leveza vista em sua ideia original. E é raro
encontrar um cinema que conceda ao espectador esse tipo de pureza narrativa.
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