O ator durante visita a São Paulo na divulgação de Os Cowboys |
Finnegan Oldfield esteve no Brasil em 2016, ocasião em que
divulgou Os Cowboys durante o
Festival Varilux de Cinema Francês, no Rio de Janeiro e São Paulo. Filme atual
em relação à situação do Estado Islâmico e a adesão de jovens europeus à doutrina
de terror preconizada pela organização, Os
Cowboys, apesar de ter sua história centrada no final dos anos 1990 e
início dos anos 2000, traz uma reflexão precisa para o que acontece no velho
continente (principalmente na França) nos últimos anos.
Sobre esses aspectos da obra e outros assuntos, Finnegan Oldfield
conversou com o blog Película Virtual.
OS COWBOYS ME REMETEU EM DIVERSAS CIRCUNSTÂNCIAS AO CLÁSSICO DE
JOHN FORD, RASTROS DE ÓDIO.
Sim, há diversas semelhantes. Mesmo não sendo uma refilmagem
e eu não tendo utilizado o Rastros de
Ódio em minha pesquisa, Thomas (Bidegan, diretor) me mostrou outros filmes
na construção de Os Cowboys, como Cidade das Ilusões (Fat City), de John Huston, que não chega a ser um western, mas é
uma obra que aborda a transmissão de uma pessoa para outra. É disso que fala o
filme, mas utilizando todo esse viés e os códigos todos dos filmes de faroeste.
Foi exatamente isso que ele quis fazer. Utilizando essa referência nos filmes
de faroeste, como o uso dos planos abertos de montanhas e paisagens, por
exemplo. Como no momento em que ele está fumando um cachimbo da paz junto aos
talibans, em outra cena vemos pessoas a emboscá-los de cima de um prédio como
se fossem índios nos desfiladeiros. A partir de um certo momento, o filme passa
a ser um faroeste, principalmente quando já o vemos com seu revolver em punho e
na cintura.
SEU PERSONAGEM NO
FILME É BEM SOLITÁRIO. COMO SE DEU A SUA CONSTRUÇÃO?
Eu li muitas vezes o roteiro. Foram muitas conversas com o
Thomas (Bidegain) sobre a personagem e suas ideias de como ele queria que esse
adolescente se transformasse em um homem, em um cowboy. E isso foi muito
interessante para o trabalho de ator e foi um desafio que eu encontrei para
fazer esse papel.
A FRANÇA VEM PASSANDO
POR UM PERÍODO CONTURBADO EM RELAÇÃO À POLÍTICA E A GUERRA CONTRA O EXTREMISMO
DE ORIGEM RELIGIOSA. COMO FOI ABORDAR ESSE TEMA NO FILME?
Curiosamente, no caso de Os
Cowboys, o filme foi feito antes dos atentados ao Charlie Hebbo, antes dos
atentados de novembro de 2015. Isso o torna um filme ainda mais atual. Outros
diretores realizaram trabalhos com temas relacionados e acabaram pagando o
preço de não ver suas obras sendo lançadas por conta do contexto. Os Cowboys foi lançado na França em 15
de novembro de 2015, dois dias após os atentados. A dúvida que surgiu na época
foi na possibilidade de lançá-lo ou não. Decidimos levar adiante a data
justamente para não deixar que o terrorismo começasse a dar as ordens no
cinema. Eu concordo com o Thomas Bidegain (diretor de Os Cowboys) quando ele diz que é preferível assistir a uma obra
como essa do que aos noticiários que ficam mostrando sem parar esse assunto. É
preferível ver um filme como esse do que os canais de notícias que exibem sem
parar imagens dos atentados sem se aprofundar nos fatos. Concordo que a gente
tem que estar informado sobre o que acontece, mas os filmes possuem uma outra
maneira de contar a história.
EXATAMENTE.
INCLUSIVE, ACHO QUE O FILME TEVE UMA CORAGEM IMPRESSIONANTE DE ABORDAR UM TEMA
TÃO DELICADO QUANTO A PRESENÇA DE CÉLULAS TERRORISTAS NA FRANÇA. E ISSO
JUSTAMENTE NA ÉPOCA DOS ATAQUES EM PARIS.
Foi complicado. Podemos dizer que esses fatos acabaram nos
alcançando. A realidade alcançou a ficção do filme. Quando fomos filmar na
Índia, todos nos diziam para ter cuidado por conta de riscos de terroristas e,
enquanto nós estávamos lá filmando, os atentados ao Charlie Hebdo aconteceram.
Bem ali, no centro de Paris. E decidimos continuar filmando. E essa foi a mesma
atitude quando chegou a hora de lançar o longa
QUAL A SUA POSIÇÃO
COMO CIDADÃO FRANCÊS DIANTE DESTE MOMENTO? É POSSÍVEL UMA COMPARAÇÃO COM A
POSTURA DOS ESTADUNIDENSES APÓS O 11 DE SETEMBRO?
É uma difícil comparação por conta da diferença de escalas
dos acontecimentos em relação a França e aos EUA. A nossa vida passou a ser
pontuada por atentados. A gente lembra do 11 de setembro, dos atentados a Londres,
a Madrid, ao Charlie Hebdo. E, ao mesmo tempo, estamos distantes disso tudo. É
um pouco disso que o filme fala, também. No filme, quando o personagem vê na TV
as torres gêmeas em chamas, ele se sente como se recebesse um cartão postal da
irmã pedindo por ajuda. E a gente na consegue entender o que significa enquanto não vivemos isso na casa da gente.
O FILME ABORDA UMA
QUESTÃO DELICADA QUE É A SEDUÇÃO DO ESTADO ISLÂMICO PARA COM JOVENS ÁRABES E
EUROPEUS. GEROU CONTROVÉRSIAS NA OCASIÃO DO LANÇAMENTO E PRODUÇÃO. DO MESMO
MODO, ELE ABORDA PONTOS RELACIONADOS A PRECONCEITOS, RACISMO E XENOFOBIA. COMO
SE DEU ESSA ABORDAGEM DO ROTEIRO?
O filme, na verdade, apresenta uma questão da emancipação
dessa jovem. Talvez, se ele se passasse em outra época, como os anos 1980, ela
talvez tivesse seguido para outro lugar, como Londres, morar em um cubículo e
ficar se drogando. E a historia começa antes disso, em 1997, quando ainda não
era comum que os jovens se juntassem ao Estado Islâmico. No fundo, é uma
história sobre pessoas comuns que vão se sentir aspiradas por essa agitação e
confusão que acontece no mundo. Em relação ao racismo, é verdade que o pai é
bem aquela figura francesa que tem aquela postura xenofóbica e alguns
comentários racistas acerca de imigrantes. Na metáfora do filme, o pai acaba
considerando que essas pessoas sejam como os índios. Já o filho, não. Ele passa
a ver os estrangeiros de uma maneira muito mais aberta. E isso é o que fará
dele um cowboy, um herói. O Thomas queria fazer um filme sobre essa abertura de
espírito. Sobre a mistura de raças. Sobre como é possível aprender as lições
dos seus ancestrais e de como o conhecimento passa de uma geração para outra.
EM SEUS FILMES ANTERIORES, HÁ UMA CONSTANTE ABORDAGEM DE CUNHO SEXUAL. COMO SE DEU ESSE PROCESSO DE ESCOLHAS DE PAPÉIS?
Não cheguei a ver muitos filmes franceses com temáticas sexuais e não há muitos que sigam essa vertente. Em relação às minhas escolhas, são temas interessantes. Por isso eu aceitei fazer esses filmes. Para Mineurs 27, o que me interessou foi como uma pessoa consegue crescer tendo sido vitima de abusos, como ela consegue superar isso. Bang Gang seguiu o mesmo questionamento de como os jovens vivem essa liberdade sexual e experiências nas quais eles podem erra e em seguida se corrigir e superar tudo isso. Principalmente a visão que as outras pessoas têm disso em tempos nos quais as redes sociais são tão ativas.
QUAIS SÃO OS SEUS
PRÓXIMOS PROJETOS?
Já estou com um novo filme pronto, dirigido por Bertrand
Bonello (diretor de Os Amores da Casa de
Tolerância e Saint Laurent). O
filme se chama Nocturama e aborda um
grupo de jovens de esquerda que colocam bombas em Paris. São jovens que não
percebem muito bem o que estão fazendo, inconsequentes que começam a perceber
que fizeram algo muito errado e começam a perceber a gravidade de seus atos. É
quando o filme começa a ser algo que se passa entre quatro paredes. Esse roteiro foi escrito antes de todos os
atentados e se chamava antes Paris é uma
Festa, mas precisou ter seu título modificado.
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