(Split, 2016, EUA) Direção: M. Night Shyamalan.
Com James McAvoy, Anya Taylor Joy, Betty Buckley, Haley Lu Richardson, Jessica
Sula.
Por João
Paulo Barreto
Com uma carreira repleta de altos e baixos (mais baixos do
que altos, é bem verdade), M. Night Shyamalan acerta a mão em Fragmentado, trabalho no qual ele volta a
mirar nas questões psicológicas do ser humano e suas consequências para o mundo
à sua volta tal qual havia feito no subestimado A Visita, seu longa anterior.
Aqui, diferente da psicopatia cruel e displicente do casal
de idosos do filme de 2015, James McCavoy traz para seus vinte e quatro
personagens (mas somente seis evidenciados e desenvolvidos pelo filme) uma
mescla exata da citada crueldade, de frieza, doçura, inocência, pragmatismo,
aspereza e brutalidade, características inerentes a cada uma das pessoas que
habitam sua mente. Com uma atuação precisa, o jovem ator escocês parece flutuar
de uma performance para a outra, trazendo para o público uma marca reconhecível
para cada personalidade que habita o corpo do protagonista, seja ela a postura inflexível,
um olhar ou um modo infantil de se expressar. Em uma construção na qual as
nuances são imprescindíveis, McAvoy coloca cada uma delas em serviço da sua
excelência.
McAvoy e sua versão infantil |
Na história, o atormentado homem sequestra três jovens e as
mantêm como reféns em um ambiente subterrâneo. O pretexto é o de que elas servirão
como alimento para uma criatura que ainda surgirá, algo que logo percebemos se
tratar de uma nova personalidade do sequestrador. Em seu roteiro, Shyamalan
cria uma atmosfera incomoda de tensão justamente pela ideia de que o foco dessa
vez possui raízes no universo real, sem qualquer tipo de escape relacionado com
algo sobrenatural ou imaterial. O perigo aqui é calcado no plausível. E o
incomodo principal do espectador está diante justamente desse fato.
Na figura da personagem de Anya Taylor-Joy, que já havia se
destacado no thriller A Bruxa,
Shyamalan aproveita para explorar uma de suas marcas como roteirista que é a
perda da inocência infantil, além de voltar a aplicar outra marca que é a da
câmera subjetiva a partir do olhar de uma criança. No caso, Casey Cooke,
personagem vivida por Joy na adolescência, possui um passado de abusos, no qual
foi molestada pelo seu tio (a forma como o diretor opta por evidenciar choca
pelo modo ao mesmo tempo sutil e monstruoso como tal fato é mostrado). Neste
arco, a riqueza de interpretações que o roteiro oferece denota bem a
profundidade da escrita do diretor. Em uma história na qual um personagem
monstruoso esconde sua verdadeira face no intuito de conquistar a confiança de
uma criança, o que dizer de um personagem que possui várias personalidades, mas
todas elas são fieis ao próprio conceito de autenticidade, sem dissimulações ou
truques? Ele é o que é. Curioso exercício o de imaginar quem é o verdadeiro
monstro aqui.
Casey em seu primeiro momento de desespero |
Mas o que impressiona de fato no filme ainda é a atuação de
McAvoy. Seja em uma sutil homenagem de Shyamalan ao seu principal ídolo, Alfred
Hichcock, com tomadas que referenciam Norman Bates e Psicose (principalmente quando uma personalidade feminina do
protagonista é inserida em rápidos vislumbres para depois se revelar), ou quando
a tal última e definitiva pessoa na mente dele é trazida à vida e sua característica
animalesca é evidenciada de modo ao mesmo tempo fascinante e asqueroso.
É bom tê-lo de volta à velha forma, M. Night.
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