Por João Paulo Barreto
Há duas análises que precisam ser feitas acerca de Amor por Direito, novo filme estrelado por Julianne Moore, atriz de admirável entrega aos seus personagens e que, aqui, não faz diferente. A primeira diz respeito à importância do tema abordado pelo longa, que traz na história real do casal formado pela detetive de destaque Laurel Hester (Moore) e Stacie Andree (Page).
No começo dos anos 2000, as duas passaram a viver através de uma união estável devidamente registrada legalmente. Adquiriram juntas uma casa e tocaram a vida. No entanto, um câncer em estágio terminal no pulmão de Laurel, que fumava constantemente, interrompe o que seria um final feliz e a preocupação desta passa a ser não somente por seu tratamento, mas no fato de que, após partir, Stacie não poderá receber a pensão que vai permitir que ela possa manter a casa adquirida por ambas.
Nesta análise inicial, como disse, é preciso abordar a relevância do tema que o filme traz. No ano seguinte ao reconhecimento legal do casamento entre pessoas do mesmo sexo em solo estadunidense, conhecer uma história como essa, na qual um grupo vereadores de Nova Jérsei decide não conceder a pensão à sobrevivente por conta de detalhes burocráticos, é bastante impactante.
Julianne Moore e Ellen Page em boas atuações |
A luta de ambas por reconhecimento movimenta todo o condado onde vivem, com grupos de suporte protestando pela liberação do direito de Stacie ser beneficiária legal de Laurel. Steve Carell rouba a cena como um afetado líder em prol dos direitos dos gays. É uma história deveras tocante e a atuação de ambas, tanto Moore quanto Page, emociona em seu ato final.
Porém, em sua segunda análise, dessa vez abordando os aspectos técnicos e o trabalho de roteiro escrito por Ron Nyswaner, que já havia concebido a história de Filadélfia, o filme traz certos incômodos impossíveis de não notar. Primeiramente, o modo como a relação das duas mulheres é desenvolvido é um tanto superficial, não gerando (ou tardando a gerar) uma empatia por parte do público. O longa, talvez por conta de suas elipses, falha ao construir para o espectador a sólida relação de Laurel e Stacie. Claro, há os momentos em que ambas encaram o preconceito, mas o filme carece de uma força no sentido de criar a dependência emocional de uma para com a outra.
Claro que existe o fato de que as duas vêm de um universo incontestavelmente machista. Uma é policial, a outra trabalha em uma oficina mecânica. Tais fatos colaboram na ideia de que, calejadas por toda homofobia que vivem no dia a dia, seja difícil demonstrar uma entrega a uma relação de modo aberto e sem amarras. E isso o filme consegue trazer de modo satisfatório, nos momentos em que vemos Laurel recriminar Stacie por atender seu telefone ou quando a policial precisa deixar um bar devido ao fato de que viu um colega de trabalho. Porém, é inegável que o roteiro careça, ao menos em seu primeiro ato, de uma melhor construção emocional daquela relação.
Fase terminal da doença: luta pelos direitos e pela vida |
Frisei o primeiro ato por conta do fato de que, em sua segunda parte, após o diagnóstico de Laurel, há uma inegável mudança na narrativa, trazendo os personagens mais estabelecidos em sua conexão emocional. Isso acaba por refletir de modo positivo no espectador, uma vez que a dor, tanto física quanto mental, observada na relação das duas consegue, finalmente, criar junto ao público o necessário envolvimento para com toda aquela situação. Não que seja necessária uma conexão estoica com o filme, mas, por conta da alteração do tom das atuações, principalmente no trabalho de Ellen Page, o longa passa a funcionar melhor neste ponto.
Relevando os momentos panfletários e artificiais, como a já clichê cena de tribunal, quando um esperado veredito é dado e todos aplaudem felizes, ou quando personagens antes insensíveis à causa passam a lhe dar suporte, Amor por Direito consegue captar bem a reflexão do importante tema.
E ter Julianne Moore em mais uma entrega excepcional, não atrapalha de forma alguma.
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