segunda-feira, 4 de abril de 2016

Para Minha Amada Morta

(Brasil, 2015) Direção: Aly Muritiba. Com Fernando Alves Pinto, Lourinelson Vladmir, Mayana Neiva, Giuly Biancato, Vinicius Sabbag.


Por João Paulo Barreto

Para Minha Amada Morta consegue transmitir um tipo de sentimento singular a partir de seu protagonista, o fotógrafo forense Fernando. Viúvo e ainda preso ao amor que sente pela sua esposa, se dedica a manter a memória de seus dias com ela através do cuidado e do apego às roupas da falecida. Sob sua responsabilidade, o filho pequeno segue o mesmo caminho do pai na postura de não deixar para trás a presença da mãe em suas vidas.

É um filme sobre apego. Ao mesmo tempo, é sobre o tal do “deixar passar”. Mas é também sobre o reconhecer dos erros de quem se ama e, apesar de não perdoá-los, compreendê-los e viver com eles. Deixe-os estar. Certo, mas escrever isso é fácil. Vá experimentar fazer, vai. Complicado.

Fernando descobre que sua mulher o traia ao encontrar fitas VHS que ela gravou nos momentos de intimidade com seu amante. Após isso, qualquer tipo de afeto nostálgico que sente se torna algo pernicioso. Seus dias de cuidado e lembranças se tornam de desleixo e amargor. A pistola de seu trabalho em cima da mesa enquanto dorme no sofá vira brinquedo na mão do filho pequeno. Mal percebe que uma nova tragédia o ronda. 

Perda de um romantismo idealizado: Fernando encontra outra persona de sua amada
Desesperado, arquiteta encontrar o tal homem e se vingar de alguma forma. Pelo menos, é isso que pensamos. No entanto, nem mesmo ele sabe o que fará. Aly Muritiba é cuidadoso na criação e desenlace de sua história. Brinca com a tensão de seu público. Em certo momento, vemos os dois homens conversarem, enquanto Fernando manipula todo o dialogo na intenção de escutar Salvador, o amante, falar sobre seu caso de amor. A conversa é toda registrada sem cortes, sem trilha. Apenas o som da pá sendo utilizada pelo marido traído para limpar um terreno. E toda a tensão vai sendo construída justamente por esperarmos pela reação explosiva do homem. Mas, não. Nada de saídas fáceis aqui. Nada de sangue no olho e clichê violento. O que importa para Muritiba é o estudo de seus personagens. Cada nuance, cada camada daquele trauma psicológico que vai se construindo. 

O tipo de vingança que vemos o protagonista buscar acaba se tornando algo além. Inicialmente, o ódio que vemos em seu olhar ao observar Salvador nos leva a crer que a explosão será inevitável. Mas há certo aspecto doentio no modo como Fernando se tortura ao optar por conviver durante dias junto à família do homem que lhe tirou de uma ilusão romântica. Aos poucos, ele começa a perceber como qualquer atitude de dano físico que ele busque não lhe trará satisfação. Em paralelo, percebe que não há mais nenhuma magia em sua idolatria pela tal amada morta. Sendo assim, qualquer ato “por sua honra” será inútil.

Fernando encontra Salvador
Foi preciso muito mais do que um processo de luto para fazê-lo chegar a tal conclusão. O tal sentimento singular que citei no começo deste texto é justamente esse. A satisfação de Fernando ao seguir por vingança contra aquele que lhe tirou de seu transe de romance idealizado acabou não sendo aquilo que ele buscava. 

Em seu quadro final, Para Minha Amada Morta denota o que realmente vale a pena para Fernando daqui para frente. Mas, claro, não sem antes compartilhar com quem, mesmo que indiretamente, lhe abriu os olhos para um pouco de seu amargo apego.
  

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