Por João Paulo Barreto
O diretor Carlos Nader conseguiu criar em A Paixão de JL uma obra densa, capaz de tornar sua sessão pesada, realmente difícil de se assistir. No entanto, todos esses adjetivos não classificam seu trabalho como negativo. Pelo contrário.
Dentro de toda aquela construção na qual a vida de seu protagonista, o artista plástico José Leonilson, nos é apresentada a partir do áudio de fitas K7 gravadas como um registro diário feito pelo próprio rapaz, nós passamos a conhecê-lo dentro de todas as suas minúcias, desejos e idiossincrasias. E justamente pelo fato dos registros terem sido feitos de modo tão particular, lá se encontra um retrato único de um homem entregando suas dúvidas e sentimentos a quem interessar possa.
Através de uma opção minimalista de montagem, na qual os desenhos e obras artísticas de JL são exibidas em paralelo à sua fala, vamos conhecendo sua trajetória de vida no final dos anos 1980 até sua morte, vitima do HIV, em 1993, aos 36 anos de idade. Com poucas inserções visuais além de imagens de filmes assistidos por JL, como Meu Pé Esquerdo, Paris Texas e Asas do Desejo, trechos de jornais, como a ascensão e queda de Collor, a derrubada do Muro de Berlim e o bombardeio a Bagdá por George W.H. Bush, Nader demonstra uma noção exata do material que tem em mãos juntamente com o modo como quer apresentá-lo, bem como um domínio do objeto de estudo do seu filme.
Imagem de uma das fitas de JL |
Desde suas inseguranças no que tange à sua opção sexual (“ser gay hoje em dia é como ser judeu na Segunda Guerra”); passando pelas tocantes declarações de amor para seus pais ao encontrar uma foto dos dois; até os momentos de pura ingenuidade quando o vemos falar sobre um choro durante a novela ou a carência latente quando ele diz que queria apenas ter alguém para ficar abraçado, a narração nos aproxima de José Leonilson de modo tocante. O modo como o vemos gravar um depoimento em meio às lágrimas por conta do bombardeio citado acima denota bem tal sensibilidade.
Minimalista: Carlos Nader se espelha nas obras de JL para construir seu filme |
Passamos a torcer por um final feliz, mesmo já sabendo que, desde o momento em que ele anuncia sua condição como portador do HIV, seu desfecho não será assim. É uma obra sensorial, na qual apenas a voz de seu protagonista é suficiente para nos tornar próximos a ele. Nós o conhecemos somente pela sua sensibilidade narrativa e pelas imagens de suas obras. Em nenhum momento tentamos imaginar como seria o rosto daquela voz.
Sim, uma obra pesada, capaz de derrubar o espectador. Mas, no entanto, quando voltamos a ela nas horas ou dias após a sessão, a sensação de leveza se sobressai. O sentimento de José Leonilson da mesma forma.
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