segunda-feira, 14 de março de 2016

Presságios de um Crime

(Solace, EUA, 2015) Direção: Afonso Poyart. Com Anthony Hopkins, Colin Farrell, Jeffrey Dean Morgan, Abbie Cornish.


Por João Paulo Barreto

Quando, em 2012, 2 Coelhos chegou às telas, fomos surpreendidos com um frescor narrativo que, apesar de não ser novidade no cinema, era muito novo no que até aquele momento era feito no Brasil. Com uma montagem rápida e dinâmica somada a uma história simples, mas que contada dentro de diversos flashbacks e com uma roupagem pop e frenética, junto a uma excelente trilha sonora, o roteiro de Afonso Poyart casava perfeitamente com o modo que ele escolheu dirigi-lo. Claro, havia Cidade de Deus, mas a roupagem pop de 2 Coelhos era, sim, única por aqui.

Era um tanto óbvio que o mercado estadunidense observasse com atenção o diretor e o convidasse para filmar em terras ianques. No entanto, a expectativa de rever o talentoso brasileiro se destacar novamente não se cumpriu.

Dean Morgan e Hopkins: policial e médico trabalham juntos  
Debruçando-se sobre uma história de linhas paranormais e contando com as presenças de atores de peso como Anthony Hopkins e Colin Farrell, Poyart trouxe em Solace (que no Brasil recebeu o óbvio título de Presságios de um Crime), uma trama que, diante da proposta do peso dramático de sua narrativa e da possibilidade de explorar atuações como a da dupla citada, não carecia de um diretor cuja vontade de imprimir uma marca em cada take fosse levada como meta.

Na trama, um médico com um passado traumático (Hopkins) é requisitado por amigo policial (Morgan) na investigação de uma série de assassinatos. Com poderes paranormais que o permitem enxergar o passado e o futuro, Dr. John Clancy consegue investigar cenas de crimes com uma exatidão única.

Com a possibilidade de um trabalho sóbrio, sem firulas, focando em deixar as atuações se sobressaírem diante da direção, Poyart preferiu imprimir em cada quadro de seu filme um sinal para o espectador perceber que havia alguém com talento por trás daqueles movimentos de câmera. E não são poucos. Tantos que chega um momento em que o foco no drama representado na cena se perde diante da necessidade observá-los.

Agentes Joe Merriweather e Katherine Cowles

Tomo como exemplo o momento em que os personagens policiais de Jeffrey Dean Morgan (Joe) e Abbie Cornish (Katherine) questionam um suspeito. Inexplicavelmente a câmera gira ao redor da mesa, extraindo qualquer tensão que a cena poderia trazer dentro de uma sala de interrogatório. Em outro ponto, quando os personagens de Hopkins e Morgan estão em uma casa, Poyart opta pelo deslocado enquadramento de filmar seus reflexos de uma mesa de centro (?!). E não é só isso: em mais um filme que pensa se passar em 1999, vemos o bullet time sendo utilizado.

E há o problema da falta de química entre os protagonistas. Na tentativa de se criar uma empatia entre Joe e Dr. John, o roteiro tenta inserir um sinal de identificação que, supostamente, fará quem assiste perceber que uma amizade de longa data está por trás daquela relação. A escolha para tanto está no pedido constrangedor (tanto para o espectador quanto para o pobre médico) do policial para que o personagem de Hopkins exiba “aquele sorriso”. Um face palm neste momento foi inevitável.

Farrell e Hopkins: momento de medir forças
Mas, preciso admitir, não é somente de erros que é composto Solace. Há um ótimo momento de tensão quando o Dr. John encontra seu antagonista Charles Ambrose (vivido por Colin Farrel). Passada dentro de um bar, a cena imprime um ótimo diálogo quando os personagens descrevem as possibilidades daquele encontro, denotando, assim, as capacidades de seus dons. 

Mas, ao final, é muito pouco. Talvez por culpa das exigências de uma produção gringa ou, de fato, pela vaidade de um diretor talentoso que, infelizmente, se rendeu à necessidade de querer ter mais destaque que seu próprio trabalho, Solace fica como uma decepção para a curiosidade ávida que levantei pelo próximo trabalho de Poyart quando escrevi acerca de sua estreia quatro anos atrás.

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