(Espanha, 2016) Direção:
Pedro Almodóvar. Com Emma Suárez, Adriana Ugarte, Michelle Jenner, Rosy de
Palma, Daniel Grao, Dario Grandinetti.
Por João Paulo Barreto
Em Julieta, Pedro
Almodóvar retorna ao tema da perda
dentro do universo feminino cujo conhecimento profundo o consagrou. Aqui, o
cineasta destrincha a dor da personagem título, uma mãe cuja falta de
informações acerca do desaparecimento voluntário de Antia, sua filha de dezoito
anos, a atormenta.
É um filme que destrincha todo o impacto destrutivo, físico
e emocional, que a ausência de um filho pode causar. Em seu roteiro, baseado no
conto escrito por Alice Munro, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 2013,
o diretor espanhol traz para o espectador justamente isso, uma análise da perda
e a forma impossível como uma pessoa consegue se recompor e seguir adiante de
modo a deixar aquela ferida, apesar de aberta, incomodando o mínimo possível.
A Julieta do título é uma professora aposentada que, na
inércia, parecia ao menos tocar a rotina doze anos após o desaparecimento da
única filha. Ao reencontrar Beatriz, uma jovem que costumava ser amiga de
Antia, saber que a mesma reencontrou a garota e que esta já tem três filhos e
segue a vida distante e bem, os poucos vestígios de equilíbrio emocional que Julieta parecia ter caem por terra. O acontecimento traz todo um turbilhão de
lembranças à tona, lhe obrigando a revisitar o passado, levando a mulher a
enfrentar seus demônios escrevendo sua história em forma de carta à filha.
Na angústia da perda, Julieta busca alento na escrita |
Na construção de sua protagonista, Almodóvar opta por uma
desconstrução física da mesma. Em sua juventude, vivida por Adriana Ugarte, com
os cabelos loiros chamativos, típicos dos anos 1980, seguida de uma beleza mais
sóbria e cativante em sua maternidade, um brilho no olhar e um resplandecer de
sua aparência são notáveis. Após acontecimentos trágicos e marcantes, a figura
de Julieta parece se despedaçar aos poucos. Na presença de Emma Suárez, que a
vive em sua fase mais madura, uma melancolia no olhar, rosto sempre abatido, a insegurança
nos planos e uma constante pressa no gestual, denotam seu estado de espírito
por um fio. E a queda torna-se inevitável.
É justamente essa queda que o filme se propõe a analisar.
Mas, claro, trata-se de Pedro Almodóvar. Não somente a atuação de seus
personagens constrói seus arcos. Os elementos em seus cenários, suas cores,
suas referências culturais ajudam nesta construção, criando para o espectador
uma trilha para as personalidades dos habitantes daquele mundo. Lá estão as
pistas de um universo típico. Um quadro do pintor Lucien Freud na parede, como
um espelho a revelar a face pesada da solidão de Julieta; a leitura de um livro
sobre a tragédia grega a entregar pistas do que virá a seguir, elementos que
delineiam todas as nuances de um drama áspero.
O calor da juventude e a entrega sem medos ao amor |
As tão famosas cores de Almodóvar, claro, se fazem
presentes. Cores inicialmente vibrantes que vão representando a perda de calor
na vida de Julieta. De modo sóbrio, o diretor acerta ao não ceder ao melodrama
escancarado, deixando a tristeza se fazer presente de forma genuína. E essa
tristeza vai sendo representada de maneira sutil em seus cenários, com as cores
quentes das paredes que, gradativamente, viram tons pastel, como a exibir a ausência
de energia na vida de Julieta. Isso é
visto, também, nos bolos que ano a ano a mulher compra para celebrar o aniversário
da filha. Bolos que vão se tornando mais discretos com o passar do tempo e que,
de modo brilhantemente sagaz, Almodóvar registra no lixo em cada ocasião.
Trata-se de uma película feminina em sua essência, que
observa as dores daquelas mulheres em suas mais variadas nuances. Na presença
da mãe senil de Julieta, um contraste impressionante com a jovialidade e
felicidade no rosto da nova namorada do seu pai, também feliz por poder
recomeçar a vida, mas sem agir com egoísmo ao permitir-se cuidar da esposa
doente com a ajuda de seu novo amor. No mundo de Almodóvar, conceitos de certo
ou errado ganham variados significados. E os homens acabam por ser representados
de modo alegórico, como vemos nas esculturas com genitais expostos (uma delas,
inclusive, abrindo o filme), que uma das personagens define como “pesadas para
que vento não possa derrubar, como as pessoas de lá”, referenciando o lugar
onde vive às margens do oceano.
Elementos inconfundíveis no universo de Almodóvar |
É uma obra repleta de rimas visuais. Em uma delas, vemos um
mar calmo inicialmente convidar a protagonista, lhe dando boas vindas à casa do
amor de sua vida. No dia que sua vida sofre o primeiro golpe, o oceano revolto
parece querer expulsá-la, cumprindo sua função de tirar-lhe parte de sua existência.
Na ausência de trilha sonora, inclusive, o diretor entrega um filme cujo silêncio
colabora para o espectador compartilhar o vazio na vida de sua protagonista.
Nos créditos finais, com a pesada “Si no te vas” na interpretação de
Chavela Vargas, um resumo daquela dolorosa angústia sentida por Julieta e uma
mão que, carinhosamente, traz o espectador de volta ao mundo, conduzindo-o para
fora do cinema.
Mas a vontade de ficar ali naquele universo parece maior. Poucos
autores conseguem tal intento. Pedro Almodóvar é um deles.
Ótima critica! Parabéns!
ResponderExcluirÓtima critica! Parabéns!
ResponderExcluirDaquelas críticas que alargam nossa visão e desfrute do filme pós-sessão. Obrigada, João Paulo!
ResponderExcluirAdoro críticas que enxergam além do autor!
ResponderExcluirA perda de um filho/a, a que título for, praticamente acaba com a vida de uma mãe.
ResponderExcluirMontanhas de dor; confusão mental; negação, raiva, ódio. E culpa. Muita Culpa.
Recorrer a Deus é o caminho para os que N'Ele creem.
Entregar nas mãos de Deus!!!
Buscar auxílio terapêutico, medicamentoso para aquietar o tsunami.
Datas festivas aumentam o inferno.
Aniversário, Dia disso, daquilo, tudo é um horror.
O filme é excelente!!!
Mas, é preciso viver!!!!
Continuar a jornada.
Houve erros, extrapolando limites, causamos conscientes ou não, algum trauma no ser amado que geramos?
Sim, é possível! Somos humanas.
Quando começamos a analisar nossas falhas, a culpa perde força.
Por que mães, antes de mães são apenas seres humanos, com toda a vulnerabilidade que essa condição implica.
Mães não são Deus.
Espero que toda mulher retorne à vida,
permitindo-se novas experiências, mesmo que tenha sofrido a terrível dor de uma perda filial.
Será antinatural voltar a viver quando existe uma perda filial em nossas vidas? Deixo a questão em aberto.*******************
A perda de um filho/a, a que título for, praticamente acaba com a vida de uma mãe.
ResponderExcluirMontanhas de dor; confusão mental; negação, raiva, ódio. E culpa. Muita Culpa.
Recorrer a Deus é o caminho para os que N'Ele creem.
Entregar nas mãos de Deus!!!
Buscar auxílio terapêutico, medicamentoso para aquietar o tsunami.
Datas festivas aumentam o inferno.
Aniversário, Dia disso, daquilo, tudo é um horror.
O filme é excelente!!!
Mas, é preciso viver!!!!
Continuar a jornada.
Houve erros, extrapolando limites, causamos conscientes ou não, algum trauma no ser amado que geramos?
Sim, é possível! Somos humanas.
Quando começamos a analisar nossas falhas, a culpa perde força.
Por que mães, antes de mães são apenas seres humanos, com toda a vulnerabilidade que essa condição implica.
Mães não são Deus.
Espero que toda mulher retorne à vida,
permitindo-se novas experiências, mesmo que tenha sofrido a terrível dor de uma perda filial.
Será antinatural voltar a viver quando existe uma perda filial em nossas vidas? Deixo a questão em aberto.*******************
A perda de um filho/a, a que título for, praticamente acaba com a vida de uma mãe.
ResponderExcluirMontanhas de dor; confusão mental; negação, raiva, ódio. E culpa. Muita Culpa.
Recorrer a Deus é o caminho para os que N'Ele creem.
Entregar nas mãos de Deus!!!
Buscar auxílio terapêutico, medicamentoso para aquietar o tsunami.
Datas festivas aumentam o inferno.
Aniversário, Dia disso, daquilo, tudo é um horror.
O filme é excelente!!!
Mas, é preciso viver!!!!
Continuar a jornada.
Houve erros, extrapolando limites, causamos conscientes ou não, algum trauma no ser amado que geramos?
Sim, é possível! Somos humanas.
Quando começamos a analisar nossas falhas, a culpa perde força.
Por que mães, antes de mães são apenas seres humanos, com toda a vulnerabilidade que essa condição implica.
Mães não são Deus.
Espero que toda mulher retorne à vida,
permitindo-se novas experiências, mesmo que tenha sofrido a terrível dor de uma perda filial.
Será antinatural voltar a viver quando existe uma perda filial em nossas vidas? Deixo a questão em aberto.*******************
FILME MARAVILHOSO, Pedro como sempre consegue destrinchar a vida e torná-la no vídeo tão humana quanto a realidade de nossas vidas, impactantes , desgastantes e temporários. A trilha sonora ficou a desejar.
ResponderExcluirFilme maravilhoso!
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