sábado, 30 de janeiro de 2016

O Filho de Saul

(Saul Fia, Hungria, 2015) Direção: László Nemes. Com Géza Röhrig, Levente Molnár, Urs Rechn. 



Por João Paulo Barreto


Um dos pontos que chamam a atenção no favorito ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro desse ano, O Filho de Saul, além, claro, de seus diversos planos sequência e câmera quase que exclusivamente em primeira pessoa, é o modo como o longa consegue tornar o espectador ciente do modo desesperador como um homem que já perdeu tudo se apega a um último desejo, tornando aquilo sua ambição nas horas que se apresentam, provavelmente, como suas últimas.

Os horrores de Auschwitz na Segunda Guerra ilustram como pano de fundo a resiliência do húngaro Saul, prisioneiro judeu que trabalha na função de descartar os cadáveres das pessoas assassinadas no local. Utilizando grandes fornos ou poços para eliminar os corpos, o exército alemão a coordenar o lugar mantém uma rotina de trabalho que demonstra a maneira como o nazismo se instaurou como uma organização lucrativa, algo ilustrado no modo como todas as roupas dos recém-chegados são reviradas na busca por objetos e seus dentes de ouro são retirados dos corpos sem vida.


Saul em momento crucial de sua busca
A busca desenfreada pela eliminação dos corpos, que têm suas cinzas jogadas em um rio a cortar a região, denota bem a preocupação do regime em não deixar rastros para seus atos. Neste contexto, Saul se depara com o momento em que um garoto que supostamente estaria morto acorda agonizante na maca de um médico alemão a fazer experimentos nos cadáveres, algo que não deixará de acontecer, uma vez que a equipe médica teve certeza de encerrar o destino do menino. 

O simbolismo da busca de Saul por um rabino e de um meio para dar ao garoto um enterro judaico cria uma dolorosa representatividade do desespero daquele homem, que precisa se apegar a uma missão suicida como aquela no intuito de conseguir manter sua sanidade. Em sua entrega total àquele gesto dedicado a um estranho, o homem busca manter uma diferenciação que o afaste daquele ambiente. 

O desespero na tentativa de manter algum traço de humanidade
Ao optar por uma razão de aspecto que mantém a visão do espectador direcionada a elementos centrais e a pouca profundidade de campo a fazer justamente uma alusão ao foco do protagonista em sua missão, o diretor László Nemes (em uma surpreendente estreia em longas metragens) consegue exatamente seu intento: colocar o espectador em uma posição de desconforto físico ainda maior, já que a aspereza de sua direção acaba por criar um impacto ainda mais doloroso em seu público.

É uma obra que incomoda, que tem em muitos dos seus méritos a não romantização do ato de falar da guerra, preferindo manter-se em um estado quase documental de exibição, no qual quem a assiste é colocado em meio àqueles horrores e não em uma situação de voyerismo.

Quando percebemos que, em sua fugacidade, as ambições de Saul se assemelham muito às cinzas oriundas de corpos que o vemos jogar em um rio, seu destino final nos parece inevitável.



Um comentário:

  1. Sou cinéfila,não gosto de happy ends nem da indústria cinematográfica americana.
    Esse filme, no entanto é de um mau gosto gritante: quase um reality show, nada tem de original. Que saudade me deu de um outro filme sobre a guerra, Bastardos Inglórios de Tarantino. Ali a violência é mostrada com inteligência e sutileza.

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