quinta-feira, 28 de julho de 2016

A Incrível Jornada de Jacqueline

(La Vache, França, 2016) Direção: Mohamed Hamidi. Com Fatsah Bouyahmed, Lambert Wilson, Jamel Debbouze.


Por João Paulo Barreto

É curiosa a atração que o cinema tem pelos underdogs. Diversos filmes já abordaram uma história que traz alguém cujas chances de conseguir êxito em uma missão auto-imposta são mínimas, mas que, nesse intento, acaba por cativar personagens descrentes e, claro, o espectador. Vide Forrest Gump ou, mais recentemente, Eddie theEagle. Curiosamente, é uma fórmula que raramente erra no sentido de causar empatia entre o público e o protagonista.

O mais novo exemplar desse tipo de filmografia é o francês A Vaca (tradução literal do La Vache, que no Brasil ganha um título fácil para o público: A Incrível Jornada de Jacqueline.) Aqui, Fahad, um agricultor da Argélia, tem no amor e cuidado com a sua vaca (a Jacqueline do título) sua motivação para o trabalho com o animal leiteiro. Após anos de tentativas de inscrições frustradas, Fahad recebe um convite dos organizadores da feira agropecuária de Paris para exibir seu bicho de estimação no evento. O único detalhe é que a feira não banca os custos da viagem, e Fahad decide ir a pé da Argélia à Paris.

Fahad e Jacqueline: ongo trajeto da Argélia à Paris
No trajeto, o homem passa por diversos percalços. E é justamente no apelo cômico das situações nonsenses em que ele se envolve que se resume os pontos positivos desta obra sem grandes ambições. Além disso, o filme traz curiosas observações acerca dos costumes argelinos em relação a aspectos banais, como o tratamento carinhoso de um marido para com sua mulher (o momento em que Fahad decide escrever uma carta de desculpas à sua esposa define bem) ou a relação que possuem tais pessoas com a atual situação da França no que se refere ao terrorismo (a frase “Je suis Charlie” é ouvida em alguns dos momentos cômicos do longa.)

Focando não somente na situação delicada dos imigrantes em relação à permanência na França, os quais o filme parece colocar em situações semelhantes vendendo artigos telefônicos para ligar para seus países no oriente ou trabalhando com quinquilharias da China, o longa também aborda o problema econômico que também afeta os próprios franceses. Vivendo atrás de um título de conde, o personagem de Lambert Wilson é um exemplo. Sendo um dos que ajudam Fahad em seu intento, o nobre sem dinheiro claramente tem em sua origem familiar apenas um disfarce para a verdadeira situação de quebra financeira que vive, mas que evita deixar transparecer.

Fahad ao lado do Conde falido Philippe e de seu cunhado, Hassan
Trata-se de uma obra que tem no carisma e inocência de seu protagonista seu grande trunfo. Um meio eficiente de conquistar o público por conta de seu modo sincero de agir, tornando seu plano, apesar de descabido para muitos, sua verdadeira razão para se manter fiel a ele. Descoberto por uma repórter, se torna um fenômeno de mídia, virando notícia em toda a França, em mais um eficiente estudo que o filme se propõe a fazer no sentido de analisar o modo como a sociedade parece necessitar de ídolos e de pessoas que a inspirem.

Mesmo não sendo totalmente integro em seus atos (o suborno pago a um funcionário público mostra bem isso), Fahad se transforma justamente em um ídolo. Do mesmo modo inspirador como Forrest Gump parecia atrair a todos em sua corrida sem motivo pelos Estados Unidos, Fahad parece fazer o mesmo. A diferença está apenas em seu intento final, que, ao subir dos créditos, percebe-se ser bem mais do que apenas uma feira agropecuária.

Um filme inofensivo, mas bastante enriquecedor. 

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