(Driving Miss Daisy, EUA, 1989). Direção: Bruce Beresford. Com Morgan Freeman, Jessica Tandy e Dan Aykroyd
O filme de Bruce Beresford utiliza a amizade entre dois idosos como metáfora para a discussão inter-racial nos Estados Unidos da primeira metade do século passado. Daisy Werthan (Jessica Tandy, no papel que lhe rendeu um Oscar) é uma bem sucedida professora aposentada que, apesar da idade, ainda mantém certo grau de independência ao dispensar a necessidade de um chofer para seus afazeres diários. Após um pequeno acidente ao deixar a garagem de sua casa, Miss Daisy perde a cobertura da seguradora de veículos e passa a contar com a presença de Hoke Colburn (Freeman) para levá-la aos lugares que ela freqüenta. O contrato do motorista é feito com o dedicado filho da senhora, Boolie Werthan (Aykroyd), o simpático dono de uma tecelagem local. Apesar do já previsível conflito-seguido-de-amizade do roteiro, a história da relação entre Daisy e Hoke encanta justamente por fugir das armadilhas dramáticas que o filme poderia cair.
Aikroyd e Tandy atencioso e paciente com a mãe, Boolie contrata um motorista que acaba se tornando o único amigo dela |
De forma inteligente, o roteirista Alfred Uhry, a partir de uma peça de sua própria autoria, une a evolução da amizade dos dois protagonistas com os sentimentos de exclusão social que ambos sentem. Daisy é judia, e apesar de notoriamente bem sucedida na vida, faz questão de afirmar não ser rica. De que não gosta de esbanjar dinheiro. Hoke, além de idoso, pobre e analfabeto, não tem a cor de sua pele a seu favor no período político-social em que seu país vive. Em uma cena, dois policiais brancos o abordam. Chamando-o pejorativamente de garoto, eles perguntam o que ele faz com um carro daqueles. Ao checar os documentos de Miss Daisy e de Hoke, liberam os dois sob comentários do tipo “era só o que faltava. Um crioulo velho e uma judia velha na estrada”. O que poderia ser levado de forma maniqueísta pelo filme, é inserido de modo coerente.
Amor fraterno não tarda a sobrepor o orgulho de Miss Daisy |
O contexto histórico do filme colabora para um melhor entendimento das relações entre brancos e negros que o roteiro apresenta. Observa-se durante vários momentos uma demonstração da autoridade dos patrões brancos sobre seus empregados domésticos negros. No entanto, o filme não se apega a isso de modo a antagonizar personagens. Ele prefere utilizar tais relações de modo a ilustrar o período em que se passa a história. Observe, logo na primeira cena, o momento em que uma senhora branca repreende dois de seus funcionários negros mandando-os parar de observar o acidente e voltarem ao trabalho. Em um período vergonhoso da história americana, quando negros eram proibidos de usar banheiros em locais públicos e de dividir o mesmo espaço que os brancos no transporte coletivo, a amizade entre Hoke e Daisy mostra que a relação entre patrão e funcionário pode evoluir para uma cumplicidade que apenas a solidão da terceira idade pode ilustrar.
A solidão da terceira idade é retratada de forma sublime |
Morgan Freeman apresenta uma atuação que, apesar de um tanto caricata, diverte com um autêntico sotaque sulista estadunidense e um riso que acaba virando uma marca do personagem. Jessica Tandy arrasa em uma atuação contida que permite ao espectador entender o que o peso da idade causa à personalidade e ao estado físico das pessoas. A última cena demonstra perfeitamente como a cumplicidade, adquirida em anos de uma amizade que se descobriu mais forte que qualquer laço familiar, pode tornar as pessoas tão unidas. Nota 9,0
Um filme fantastico de uma delicadeza ímpar, visto e revisto várias vezes por mim.
ResponderExcluirExcelente critica, parabens.
Fato, Dandara. Realmente para ser visto e revisto. A delicadeza desse longa é palpável. Sem contar o carisma da saudosa Jessica Tandy.
ResponderExcluirVi no cinema, quando foi lançado. Tão bonito...
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