Fotos: Cristiana de Oliveira
O diretor Walter Carvalho afirma que, após concluir a pós-produção de Raul – O inicio, o fim e o meio, documentário que esmiúça a vida pública e familiar do mito Raul Seixas, morto em 1989, sentia como se ele estivesse ali, tamanha a presença que o mito do rock nacional é capaz de causar. Também, não é para menos. Após reduzir um material bruto de 400 horas para um produto final de duas horas de duração, Carvalho só poderia, mesmo, enxergar o Raul em todo canto. “Eu queria mesmo era que ele estivesse aqui, dividindo essa barra comigo”, afirmou, durante essa divertida entrevista. Este veterano diretor paraibano que migrou para o Rio de Janeiro em 1968, aos 21 anos de idade, foi testemunha de todo o movimento musical que a cidade simbolizou nos anos 1970 e 1980. Responsável por levar às telas a vida de outro mito da música brasileira, Cazuza, e por fotografar boa parte dos melhores filmes nacionais dos últimos 15 anos, Walter afirma que, assim como aconteceu com o longa sobre o poeta carioca, foi o Raul quem o escolheu para esse desafio. Não diretamente, claro, mas ele diz contar com a sorte para ter essas oportunidades. Foi assim com Cazuza e, agora, ela se repete com Raulzito. Uma coisa é certa: os sortudos são, mesmo, os espectadores que poderão conferir a partir do dia 23 toda a genialidade de Raul Seixas através da óptica desse talentoso diretor. Com a palavra, Walter Carvalho.
Olá Walter! Tudo bem?
Olá, meu querido. Tudo bem com você?
Tudo beleza. Walter, antes de a gente começar a entrevista, eu queria te falar uma coisa. Ano passado, na ocasião da Mostra de São Paulo, eu li uma entrevista sua sobre o seu filme na qual você dizia que era somente o público que iria poder dizer se você deu ou não conta de colocar a história do Raulzito em duas horas de projeção. Olha, o que eu vou te dizer agora não será dito como jornalista, mas, sim, como apenas um bom baiano fã de rock e de Raul: você deu conta, cara. Você mandou muito bem. Ao sair do cinema, confesso que me senti extasiado, realmente muito impactado por aquelas imagens e depoimentos. A minha trajetória de vida teve muito Raul Seixas por causa de meu pai e o momento do filme onde Trem das 7 é ouvida foi a que me causou maior emoção.
Puxa, obrigado. É muito bom ouvir isso. Eu me emociono ao ouvir isso, porque você, mesmo me dizendo que fala não como jornalista, mas você sendo um, acaba possuindo uma visão e leitura muito mais aguçadas do que, normalmente, o espectador comum teria.
Na ocasião da Mostra, você falou, também, que tinha pelo menos quatrocentas horas de material para trabalhar na montagem, transformando-as em apenas duas horas de filme. Qual foi o processo que você e o montador Pablo Ribeiro tiveram que seguir para estruturar tamanha quantidade de material?
Eu estava diante de mais de quatrocentas horas de material. E olha que eu não filmei toda essa quantidade. Eu filmei duzentas e poucas horas, o que já é um absurdo. E juntando com as que eu tinha de arquivo, dava mais de quatrocentas horas. Agora, é preciso que se diga o seguinte: eu fiz 94 entrevistas. Isso é um absurdo em termos de documentário. Essas entrevistas, inclusive, grande parte delas eram de pesquisa. A parte de Salvador, onde eu escutei muitas pessoas, era puramente de pesquisa. Por exemplo, eu não conhecia o Olival (Dias Viana Filho, amigo de infância de Raul). Então, foi preciso fazer entrevistas que serviam, ao mesmo tempo, como pesquisa e como descoberta. O Olival, para mim, é uma descoberta. É um dos melhores momentos do filme por sua espontaneidade e pela revelação que ele faz. O Olival foi a melhor maneira que eu encontrei de dizer por que o Raul gostava de Elvis e por que ele o imitava. Então, respondendo sua pergunta, o que eu fiz foi pegar uma grande folha de papel onde coloquei a foto do Raul no centro e fiz uma série de quadrados em volta da cara dele. Fixei na parede da sala de montagem e fui colocando o nome das pessoas que eu tinha entrevistado com uma linha central que representava o nascimento, a infância e a morte. De um lado, eu tinha a parte, digamos, inicial do Raul, que eram os produtores, a cidade de Salvador, e do outro lado eu tinha a parte familiar. Eu não dividi isso de forma tão intencional, mas, aos poucos, aquilo foi se organizando daquela forma. Então, em um dado momento, eu descobri que estava com um filme que tinha dois planos: o primeiro era privado e o segundo era público. A cortina que conduz o plano privado acontece de forma cronológica. E o plano do público, do Raul artista, ele acontece de forma fragmentada, tanto que eu começo o filme com ele já cantando Luiz Gonzaga, já cantando Let me sing e desenhando no peito com batom a ansata (imagem que ilustra o cartaz do longa). Mas, ao mesmo tempo, ali está acontecendo um outro plano que é o nascimento do Raul, sua adolescência imitando Elvis Presley, sua mudança para Raulzito e seus Panteras na Bahia. Daí ele vai para o Rio de Janeiro, conhece Paulo Coelho, as suas mulheres, seus casamentos, seus filhos e, por fim, sua morte. Ou seja, essa vida privada é absolutamente cronológica: ele nasce e ele morre. O filme não tem medo dessa cronologia. Mas o que a perturba e que é uma coisa da própria cabeça do Raul é a sua vida pública, que ao mesmo tempo que corre junto, ao mesmo tempo elas se cruzam. E tem hora que esse privado vem para frente, tem hora que quem está em evidência é a vida pública. Então, essa é a estrutura narrativa do filme. Como é que eu chego a isso? Exatamente a partir desse núcleo que eu chamei de “genealogia da trajetória”. Eu fui com os nomes de cada pessoa envolvida na vida do Raul escrito nesses quadradinhos (produtores, parceiros, amigos, mulheres), vendo quem tinha relação com o Raul e quem tinha relação entre si. Desse modo, eu fui traçando retas e analisando cada viés. Na ilha de montagem, com meu editor, na solidão de um ano e meio, de seis a oito horas por dia, eu ia cruzando a montagem naqueles assuntos e ia descobrindo coisas. Cada assunto levava a outro viés no papel. Eu ia traçando setas de uma mulher para outra, de um amigo para outro, de uma das mulheres do Raul para um produtor. Quando terminou, se você visse o emaranhado que isso ficou, riscado na parede da sala... (risos). Houve momentos em que eu ia para casa (pausa), cara, eu ia para casa completamente perdido! Quer dizer, não é bem perdido. Eu ia para casa perturbado. Perturbado! Primeiro porque você fica com a voz do Raul dentro da cabeça. Eu, no final da montagem, achava que o Raul estava ali. Eu comecei a achar que eu era amigo do Raul.
E agora? Essa voz do Raul ainda está presente? Ainda mais estando aqui, na terra natal dele.
Eu vou te falar: hoje, quando eu estava no avião chegando a Salvador e olhei lá para baixo, eu tive uma sensação em que precisei me conter. Porque eu queria muito que ele estivesse aqui. Como eu queria que ele fosse enfrentar comigo o que eu vou enfrentar. Hoje, historicamente, eu estou entregando esse filho ao público. A partir de hoje, às 21h30min (horário em que a pré estreia ao público começou), o filme já não me pertence mais. Ele me pertence até às 21h29min. Depois disso, eu não terei mais nenhum poder sobre ele. Acabou. É o público quem vai dizer se eu dei conta ou não da vontade que eu tinha de fazer um filme sobre um mito. Filmar um mito é difícil porque você não tem como defini-lo. Eu inventei um Raul. Eu descobri, encontrei e inventei um Raul. Eu tinha um bloco de quatrocentas horas, como se fosse um sólido, que eu tive que ir arrancando pedaços de tudo que não era o Raul. Eu fui deixando dentro um Raul que eu fui encontrando e, ao mesmo tempo, inventando. Inventando a partir de que? Inventando a partir da memória das pessoas. Eu não tinha memória para saber qual era a relação dele com o irmão. O que o irmão dele me diz no filme é fundamental. É como se eu tivesse uma colcha de retalhos desorganizada. Colada de forma desorganizada. Quando eu escuto o Plínio (Seixas, irmão de Raul); quando eu escuto a Kika (Seixas, ex-mulher de Raul), o Olival, o Roberto Menescal, o Pedro Bial ou o Caetano Veloso, eu vou organizando esses retalhos até formar uma unidade, ou pelo menos uma harmonia dessa colcha de retalhos como um todo. Esse pano recortado com uma certa organização, é o Raul que eu inventei.
Essa estrutura que você citou traz para o filme algo que é bem notável. O modo como você inseriu as mulheres da vida do Raul, a fase de cada uma delas, e contrapôs opiniões para gerar um diálogo. E o mesmo você fez com os compositores. Há um momento em que você até brinca com essa rivalidade entre Paulo Coelho e Cláudio Roberto (parceiro de Raul na composição de, por exemplo, Maluco Beleza) colocando em um frame uma briga de galo, para apimentar ainda mais essa questão.
(risos) É, veja bem, o que o Paulo (Coelho) é? Ele é um escritor. O quê que eu fiz para perguntar ao Paulo sobre o Raul? Ao invés de chegar lá e perguntar assim “Como foi sua relação com o Raul?”, eu preferi ler os dois primeiros livros do Paulo e encontrei nas páginas relações, vieses, metáforas, analogias dele com o Raul. Então, toda pergunta que eu fazia para o Paulo Coelho, havia uma introdução dizendo “na página tal do seu livro, um personagem toma tal atitude. Essa mesma atitude, você tomou com o Raul em relação ao sistema. Por quê?” Então ele respondia com base no próprio livro. E o que ele faz, além de escrever? Ele é um arqueiro zen. O Cláudio Roberto, o que é? Ele é um cara que mora em um sitio, afastado do Rio de Janeiro duas horas, cheio de galinhas e outros animais, hortas, plantas, um cara que fica deitado numa rede e que cria galos. Ou seja, um atira flechas e o outro cria galos (risos). Então, eu perguntei para o Paulo: ”Paulo, quem é o parceiro mais importante do Raul?” E como ele é uma pessoa extraordinária enquanto inteligência, ele disse: “O parceiro mais importante do Raul é o próprio Raul“. O resto, que são essas analogias do galo e do arqueiro, fica por conta do espectador. Aí, bicho, aí você é o imponderável. Por que, eu lhe digo, se chega uma mosca em Genève, na Suíça (referindo-se à entrevista dada por Paulo Coelho em sua casa em Genève quando uma mosca interrompeu a conversa), onde, segundo o Paulo, não costuma haver moscas, eu imagino que é uma questão de sorte. Eu sempre digo isso. O documentarista precisa ter um pouco da sorte do goleiro na hora do pênalti. Isso, claro, é uma alusão ao filme do Wim Wenders, O Medo do Goleiro diante do Pênalti. No caso do documentarista, esse medo vem do que pode acontecer durante a entrevista. Algo que, por exemplo, venha a extrapolar sua própria capacidade de investigar.
A tal mosca durate o papo com Paulo Coelho foi, realmente, surpreendente.
(risos) Bom, imagina só: eu estou diante do Paulo Coelho, o maior vendedor de livros depois do Harry Potter. São mais de 500 milhões de livros vendidos. E, óbvio, existe uma música do Raul chamada “Mosca na Sopa”. Pois então, durante o papo com ele entrou uma mosca e passou a perturbá-lo. Bom, isso é a sorte do goleiro. Agora, o goleiro, além de ter a sorte de pegar a bola, ele tem que lidar com o acaso que é a escolha do lado certo onde a bola vai. Ou seja, o acaso daquele momento da mosca poderia passar despercebido por mim. Mas eu não permiti que isso acontecesse. Eu levei até as últimas consequências, porque eu fui muito ajudado pela sorte. Observe: primeiro apareceu uma mosca. Ele poderia ter assustado ela e continuado a falar, certo? No entanto, ele parou e falou: “Estranho, uma mosca. Não costuma ter mosca em Genève”. A mosca insiste. Aí ele faz o segundo comentário: “É o Raul”. Aí ele faz o terceiro comentário: “Não vou matar”. Ou seja, eu peguei vários pênaltis em uma partida só. Não é qualquer goleiro que pega três, quatro pênaltis em uma partida só. Eu peguei três pênaltis! Uma sorte! Foi algo que Deus deve ter falado assim: “Vou ajudar aquele cara, ali. Vou ajudar ele e o Raul” (risos). E ainda culminou com o Paulo fazendo aquele gesto de matar a mosca. Ele ainda ficou olhando para câmera com a boca aberta querendo rir durante uma fração de segundo suficiente para você não entender o que está acontecendo, algo que, claro, foi para a montagem final. São dessas coisas que o documentarista anda atrás.
Você tem a experiência de ter filmado a vida do Cazuza, e agora você filma o Raul. A vida de Gonzagão está sendo filmada agora pelo Breno Silveira (diretor de 2 Filhos de Francisco). Como um bom nordestino, você gostaria de ter assumido esse projeto?
Olha, eu gostaria muito de ter podido filmar essa história. Infelizmente não tive essa oportunidade (pausa). Curiosamente, estreia agora no final de março um filme que eu fotografei que é o Heleno. O personagem título é um ex-jogador do Botafogo que foi muito famoso e que morreu do mesmo modo que o Raul: cheirando éter. Eu sou o fotógrafo desse filme. Quando eu fotografei o Heleno, eu tinha acabado de terminar a montagem do Raul. E os dois vão ser lançados no mês. Parece coisa combinada com o diretor (José Henrique Fonseca), que é muito meu amigo, mas é uma coincidência curiosa. Dá até para fazer analogias porque os dois acabaram a vida cheirando éter.
Nos filmes que você fotografou, o espectador não consegue enxergar muito facilmente um estilo, uma marca. Eles são bem díspares em relação ao estilo. Para exemplificar, basta observarmos Amarelo Manga, Lavoura Arcaica e Central do Brasil, filmes que, no que se refere à fotografia, são trabalhos muito diferentes. Você costuma ter uma referência própria que sempre insere nos seus trabalhos, ou essa unicidade em cada filme já seria uma marca?
Eu acho que essas características são diferentes porque elas nascem de dentro do filme para fora. Eu, quando comecei a fotografar, ainda garoto, via uma coisa bonita em um filme e guardava aquilo. Aí quando eu ia fazer um filme, eu tinha aquilo em minha lembrança e queria fazer igual porque era bonito, era funcional. Eu estava trabalhando completamente errado. Um dia, eu saquei que era o contrário. Eu tinha era que entender e descobrir a fotografia que eu tinha que fazer dentro do próprio filme. E aí, quando o roteiro é escrito, de alguma forma, querendo ou não, existe uma luz ali dentro. Existe uma imagética ali dentro. As pessoas acham que a função do fotógrafo é iluminar a cena. Mas, não. Não é isso. A função do fotografo é descobrir dentro daquele roteiro, dentro daquele universo daquele argumento, qual é essa luz. Na mesma proporção que o ator tenta descobrir que personagem é aquele. Por isso que o Marlon Brando de O Poderoso Chefão é diferente do Marlon Brando de O Sindicato dos Ladrões.
Ou ainda mais impressionante a diferença dele em O Último Tango em Paris. Assusta ainda mais saber que ambos são do mesmo ano.
São do mesmo ano? Pois é, imagina só. Eu não tinha pensado nisso. Por aí você percebe. O cara em um filme é uma coisa e em outro é algo completamente diferente. Há profissionais que você observa a fotografia deles em algum filme e logo percebe que é um trabalho dele. Isso porque ela remete a ele os códigos que foram vistos em outros filmes. Isso não é uma crítica, friso. Mas é um caminho que eu não sigo. Nos trabalhos que fotografei não dá para acontecer isso porque cada filme tem uma fotografia própria que está dentro dele. Cabe a você descobrir qual é essa imagética. Às vezes eu descubro, às vezes eu chego perto e em outras eu nem chego a descobrir, realmente. Mas a minha busca é essa. Eu não penso na câmera, eu não penso na luz, eu não penso no filtro. Eu sou obsessivo dentro do roteiro. Por que? Bom, por exemplo, quando um ator entra em um ambiente, uma sala no escuro onde ele acende um abajur, o espectador é capaz de jurar que a luz exibida é oriunda dele. No entanto, aquela é uma luz cinematográfica. A luz do cinema é uma luz que você não vê. Ela está fora de quadro. É uma luz construída, mas, para mentir, por isso que o fotógrafo tem que ser um mentiroso, ele convence o espectador que aquela luz é realmente do abajur. Porque se ele for acendê-lo pura e simplesmente, aquela luz não será útil. Essa imagem, se for feita assim, ela não vale para o filme. Para valer, você precisará inventar uma luz que o filme entenda que aquilo é um abajur de uma sala e que vai clarear o ambiente. Aí é que está a questão da imagética, da visualização, da volumetria dos objetos em relação a sua captação e a sua representação aos olhos de quem assiste.
E o Lula (Carvalho, filho de Walter, fotógrafo do filme Raul – O inicio, o fim e o meio) está seguindo teoria semelhante?
Ah, o Lula está mandando bem pra caramba (risos). Agora mesmo ele está na Espanha fotografando um filme inglês, depois segue para os Estados Unidos. Mas o que eu acho bacana é filmar por aqui mesmo. Digo isso porque estou com saudade dele e não o vejo faz um tempão. Mas ele tá danado, sabe? (risos) O Lula acredita no cinema meio que de uma forma religiosa. Ele jogou a vida dele em cima disso e talvez por isso esteja mandando tão bem.
Na fotografia do Raul, você influenciou o Lula de alguma forma?
Eu influencio muito pouco os fotógrafos com quem trabalho. A minha teoria como diretor é semelhante a de um maestro em uma orquestra ou como um técnico de futebol: quem faz o gol não é ele, quem bate a falta não é ele, quem dá o drible não é ele. Quem sola, ou toca o piano não é o maestro. Mas todos eles estão sob uma regência. Sob uma estratégia, um comportamento que ele coloca para os seus comandados, sejam eles músicos ou jogadores. O diretor de cinema nada mais é do que isso. As pessoas falam muito que o cinema é uma arte coletiva. Não é porque tem muita gente no processo. Eu digo isso porque, por exemplo, eu já estive envolvido em projetos que tinha mais de cinquenta pessoas participando do processo, mas cada uma delas estava fazendo um filme diferente. Não é a quantidade de pessoas que faz o filme ser coletivo. O que torna o filme coletivo é a partitura ser tocada de forma harmônica e conduzida por um maestro que comanda o andamento, o diapasão, o ritmo, o brilho daquela orquestra. O diretor nada mais é do que isso. Portanto, o fotógrafo está para mim assim como o diretor de arte, o figurinista, o técnico de som, o montador. Então, a minha discussão com o diretor de fotografia é essa: nós temos uma série de elementos, certo? Como é que vamos circular entre esses elementos? Como diz o Godard, o cinema não é coisa nenhuma. O cinema é o que está entre as coisas. E essas coisas é o que vai eleger para o fotógrafo. Então, não adianta eu dizer assim para ele: “cara, clareia isso, escurece aquilo”. Eu posso estar até contribuindo de alguma forma, mas eu também posso estar tirando a possibilidade dele fazer uma coisa que eu não conheço. E, claro, eu não posso ser suficientemente capaz de dizer nada para ele naquele momento porque eu estou vendo todo o conjunto. Então é preciso que você ponha a bola para o cara chutar. Se não o filme não se constrói. O Andrey Tarkovskiy (diretor soviético de obras como Solaris, falecido em 1986) falou uma coisa muito interessante no seu livro, Esculpir o Tempo. Ele fala que enquanto o sangue não circular em uma mesma artéria por toda equipe, não haverá filme.
Clique aqui para ler a crítica do filme!
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