(Brasil, 2011) Direção: José Henrique Fonseca. Com Rodrigo Santoro, Aline Moraes, Angie Cepeda, Othon Bastos, Herson Capri.
Em tempos de jogadores que simulam contusões para não entrar em campo (vide o caso do atleta do Fluminense, Fred, que, recentemente, admitiu ter fingido uma lesão em um jogo –pasmem – da seleção), conhecer uma figura como Heleno de Freitas, atacante do Botafogo durante o final dos anos 1930 e na década seguinte, acaba por gerar inevitáveis comparações entre a época atual e a de outrora.
Temperamental e violento dentro e fora de campo, Heleno era o tipo de craque que valia por todo o time, como demonstram as manchetes de jornais que contextualizam a imagem do jogador logo no começo do filme. É quando conhecemos a sua figura já em um estado de saúde debilitado, internado em um asilo para deficientes mentais. A incrível expressão magra e sofrida de Rodrigo Santoro já nos dá uma pista de que aquela atuação impressionará pela entrega que o ator fez ao personagem.
Corta para os tempos áureos do jogador. No auge da forma física, mas, contraditoriamente, sempre fumando, uma característica marcante tanto para ele quanto para sua futura esposa (e uma de suas muitas mulheres), Ilma, vivida por Aline Moraes, Heleno é um bon vivant não muito diferente dos já citados jogadores da atualidade, mas que se destaca por sua dedicação ao futebol não como um emprego, mas como uma paixão. A contradição da vida de Heleno é constante. Sempre bebendo e apenas enquadrado sem um cigarro entre os dedos quando em campo, o jovem segue uma vida desregrada, repleta de vício (cheirar éter é um deles) que apenas segue uma linha rígida quando a meta é a vitória no estádio.
Transformação: Rodrigo Santoro se supera e entrega sua melhor atuação |
“Treino é jogo!”, berrava para seus colegas de time exigindo um maior comprometimento por parte deles. Batia no peito enquanto cantava o hino do Botafogo e se recusava a ficar com o dinheiro do bicho, grana oriunda do público pagante e rateada entre os atletas. “A gente só deveria receber qualquer dinheiro quando ganhasse”, bradava enquanto destruía o vestiário a chutes após perder o título para o rival Fluminense por não ter convertido um pênalti em um momento decisivo do jogo. Essa era a característica que diferenciava a figura de Heleno para os jogadores atuais, cuja, até mesmo, imagem lhes gera lucros. Seu compromisso para com o Botafogo transcendia até mesmo o cuidado com a própria saúde.
Infectado com sífilis, reflexo de sua vida sexual sem limites, Heleno se recusa a fazer um tratamento por julgar que poderá se tornar impotente. Um claro sinal da ignorância por trás da fachada glamourosa do rapaz. Para um homem que tem tudo e cujo interesse principal de vida centra-se em “futebol, cadilacs e cinturinhas”, ganhar o mundial de 1950 vem em primeiro lugar. O resto, inclusive sua saúde, pode esperar. Um erro que, invariavelmente, lhe cobrará um preço caro como veremos ao final.
Meta: esquecendo-se de si, Heleno apenas visa a vitória em campo |
Brilhantemente fotografado pelo experiente Walter Carvalho, o filme possui em seu preto e branco características visuais que remetem a Touro Indomável, (não por acaso outra cinebiografia de um atleta de vida conturbada). As imagens dos jogos durante fortes chuvas deixam bem claras as referencias à obra de Scorsese. Outro ponto louvável é a reconstituição de época do Rio de Janeiro. Utilizando imagens de arquivo de um modo que consegue contextualizar bem a primeira metade do século XX, Heleno possui uma eficiente direção de arte e figurino, que retrata de modo satisfatório os personagens naquele momento da história.
Utilizando o futebol como uma moldura para um drama eficiente e uma história de vida fascinante, o diretor José Henrique Fonseca (de O Homem do Ano), capta de forma tocante o drama interno do jogador ao perceber suas chances de conquistar um título ou de jogar no Maracanã irem se esgotando. E com a dedicação de Santoro ao papel, fica difícil não se cativar pela dramática história de vida de Heleno.
Em uma das cenas mais tristes do filme, o vemos observar, pela TV, Pelé durante a copa de 1958. Sua expressão é uma mescla de arrependimento e frustração. Algo que uma vida de excessos fez se tornar sua expressão costumaz.
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