Acabou. Sete anos após a estreia de Batman Begins, Christopher Nolan encerra a franquia que trouxe de volta o verdadeiro espírito do Cavaleiro das Trevas aos cinemas após as desastrosas versões protagonizadas por elementos que não merecem ter seus nomes citados. Ao sair da sessão de The Dark Knight Rises, o sentimento de dever cumprido era pleno. O diretor e roteirista conseguiu criar uma obra que, apesar de não superar o anterior, conseguiu manter um equilíbrio entre a necessidade de um encerramento à altura da saga e a possibilidade de referenciar os arcos dos quadrinhos que podem ser reconhecidos nesse novo longa.
Claro, o diretor não era obrigado utilizar nenhuma referência direta vinda das páginas das revistas. No entanto, o modo como ele inseriu pontos claramente oriundos dos impressos e sutis adaptações de momentos já vistos nas publicações da DC Comics, permite que tanto o espectador não iniciado no universo dos quadrinhos quanto o fã do Batman apenas cinematográfico consiga vivenciar um roteiro que, literalmente, deixa o público esgotado ao testemunhar os acontecimentos apresentados nas duas horas e quarenta e cinco minutos deste último capítulo. E se uso o termo “esgotado” para caracterizar isso, o faço a partir do lado positivo que a palavra possui.
Tom Hardy como Bane: olhos injetados em atuação sublime |
Bane, da mesma forma que o Coringa de Heath Ledger, é um terrorista. Ambos são anarquistas, porém a potencialidade política do discurso do vilão de Rises o torna mais profundo que o deformado personagem vivido pelo falecido ator. “Algumas pessoas só querem ver o mundo em chamas”, salientou Alfred sobre o Coringa no longa anterior. Dessa vez, a ambição do antagonista é maior. Ele quer ver o mundo pegar fogo, mas isso não tem como base somente a destruição. A necessidade de passar às pessoas de Gotham um discurso politizado a respeito do clichê (no lado positivo da palavra) “tempos desesperadores exigem atitudes drásticas”, é, inicialmente, o que move o vilão de Tom Hardy. E isso faz dele um personagem com ainda mais profundidade que o de Ledger.
Fisicamente superior e intelectualmente igual ao Batman, o Bane de Hardy é de uma presença que impressiona. Desde a voz assombrosa por conta da máscara que ameniza as dores que sente, até o porte muscular do ator, a presença do personagem em cena é um destaque que engrandece ainda mais o longa. A voz de Hardy soa impactante desde o primeiro momento, nos minutos iniciais do longa, quando o vemos em um avião durante uma espetacular sequência. Se em Ledger tínhamos o tique nervoso de lamber os lábios e as cicatrizes, em Hardy são os olhos injetados de ódio que chamam a atenção. Nada mais natural, uma vez que o ator, além de sua presença corporal, não teria, além de sua voz assombrosamente bem aplicada ao visual, nenhum outro modo de demonstrar o quão feliz foi Nolan ao escalá-lo para o papel. Além desse detalhe, é notável o desprezo que o assassino possui pelas pessoas que o cercam. Do seu modo de andar, seguro de si, segurando o colete que veste à forma como se refere ao Batman pelo seu nome verdadeiro, tudo na construção de Hardy denota o poder de Bane.
A trama se passa oito anos após os acontecimentos vistos no segundo filme. Gotham não possui mais o Batman. Recluso, Bruce Wayne sofre os danos sofridos pelo seu corpo nos tempos em que ainda era o herói e é visto pelo povo da cidade como um novo Howard Hughes. Com a chegada de Bane à cidade (“um homem nascido e criado no inferno”) com um plano de dominação que será executado de forma a tornar o povo os verdadeiros protagonistas do caos, o vilão já se diferencia da proposta anárquica e auto proclamada “sem planejamento” do Coringa. Dessa vez, a intenção é, além de fazer os cidadãos da cidade mostrarem suas verdadeiras faces, destruí-la até as fundações. Nesse ínterim, a história vai apresentar artifícios que incluem fusões nucleares, reviravoltas com referências a personagens anteriores e um discurso do vilão que é, desde já, um dos momentos mais brilhantes do longa.
Presença física: personagem capaz de destruir o Batman |
O mesmo pode se dizer da Selina Kyle de Anne Hathaway, que cumpre a proposta de adequação à verossimilhança da realidade do roteiro de Nolan e aparece como uma ladra comum, que possui a única intenção de sobreviver. E se para isso ela precisar entregar certo personagem à ruína, ela o fará, mesmo que se arrependa depois. Sem contar que, claro, a atriz exala uma sexualidade ímpar, o que me leva a comentar sem nenhum pudor as belíssimas tomadas em que ela aparece pilotando a moto do Batman. Bravo, Anne, bravo.
Anne Hathaway, a Selina Kyle do mundo real: "apenas" uma ladra. |
Apesar de sobrecarregar um tanto o longa com as diversas subtramas apresentadas, o que acaba prejudicando o ritmo do filme em determinado momento, o roteiro dos irmãos Nolan apresenta uma conclusão nos faz esquecer desse detalhe. Para tanto, as atuações de Gary Oldman e de Michael Caine são as que mais se destacam. É um filme capaz de fazer com que o espectador experimente diversas emoções no decorrer dos 165 minutos. E fica a cargo do talento dramático de Caine as cenas em que a garganta dá um nó e é muito difícil segurar as lágrimas pelo que estamos presenciando.
Soberba atuação de Michael Caine representa os momentos de maior emoção |
E se no primeiro Batman, a fotografia fazia questão de demonstrar-se dourada, representando o alvorecer de uma esperança e de um novo herói, no segundo, o azul constante das cores na tela já começavam a trazer a ideia de perda, de tristeza, algo que gradativamente vai se tornando negro (como é perceptível no combate final de Batman com Duas Caras).
Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge, o diretor de fotografia Wally Pfister, parceiro habitual de Nolan, inseriu a cor preta, o frio, a chuva, como algo a representar a desesperança, a ruína de uma tragédia anunciada que transformará Gotham. Junto com essas cores, Hans Zimmer retorna com uma trilha sonora ainda mais tensa, que permite poucos (mas eficazes) momentos de silêncio do som diegético (da própria história) do filme. E se a montagem de Lee Smith não permite que certos momentos sejam mais sutis (como o olhar de certo personagem na última cena), as cenas de ação fazem jus à proposta de grandeza do diretor.
É, de fato, uma saga que fará falta. Agora que acabou, a pergunta que fica é a mesma que fiz em 2005 ao testemunhar Batman Begins: por que demorou tanto para alguém notar a potencialidade de um personagem como esse no cinema? Ainda bem que foi Christopher Nolan quem percebeu isso a tempo.
Concordo que seja esse o melhor no quesito reviravoltas e que Graças a Deus Nolan viu um ponto forte no Homem Morcego. Apesar de um errinhos básicos o filme não perdeu seu charme. É sim um dos melhores do ano.
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