Por João Paulo Barreto
Dez anos após o lançamento do
primeiro filme da, até então, bem intencionada franquia do aracnídeo bancada
pelo diretor Sam Raimi, Marc Webb (500
com ela) lança sua versão para origem de um dos mais adorados heróis das
histórias em quadrinhos Marvel.
O Espetacular Homem Aranha possui, sim, mais erros que acertos. No
entanto, tais erros não tornam o filme ruim. Arrisco-me a dizer que esse reboot da franquia acaba sendo mais
orgânico que a estreia do cabeça de teia em 2002. Mais fiel aos quadrinhos, uma
vez que insere os personagens da forma correta cronologicamente (Gwen Stacy
como a colega de classe de Peter no lugar de Mary Jane; as pistas plantadas
para o futuro de Parker como fotógrafo do Clarim Diário), essa primeira parte
de uma possível trilogia mantém o ritmo da história sem solavancos no
desenvolvimento, o que é um acerto.
Emma Stone como Gwen Stacy: perfeita caracterização |
Enquanto que no primeiro Homem
Aranha parecia haver certa pressa para a apresentação da história ao inserir
ainda no arco inicial figuras como o editor J.J. Jameson, dessa vez o
roteirista James Vanderbilt (de Zodíaco)
em parceria com Alvin Sargent (veterano que já havia participado do roteiro de
outros dois filmes do herói) e Steve Kloves (da série Harry Potter) preferiu tornar a narrativa mais fluída, valorizando
o vasto material que possui e sabendo utilizar com parcimônia os elementos de
um universo tão amplo como o do aracnídeo.
Dessa forma, o filme prefere
valorizar mais a relação de Peter (Andrew Garfield) com os pais, inserindo-os
como personagens que fazem parte das motivações do rapaz, algo que foi ignorado
na franquia de Raimi. Assim, quando o jovem descobre pontos em comum entre o trabalho
de cientista do seu falecido pai com os estudos do Dr. Curt Connors (Rhys Ifans)
voltados para crescimentos de membros amputados, ele decide procurar o
pesquisador para desvendar esse mistério em sua família. E, claro, será no laboratório
da Oscorp (pista para o vilão do segundo filme) que Parker será picado pela
aranha modificada geneticamente e desenvolverá os poderes que o farão
assumir-se como herói.
Rhys Ifans: boa escolha de ator que não se refletiu no vilão digital |
Dessa vez, as teias não são orgânicas,
algo que o filme desenvolve de forma interessante para diferenciar-se da
trilogia anterior. As cenas em que Peter treina em um galpão usando seu skate e
correntes para se pendurar fazem a história mais fiel à realidade, tornando
mais fácil a identificação do espectador com o protagonista. Outro ponto de
acerto é o modo como o roteiro insere a adaptação de Peter aos novos poderes.
Em duas cenas repletas de boas gags visuais, vemos o jovem acordar tanto em um
vagão de metrô ao ser abordado por uma gangue, quanto em seu quarto sem ter
como controlar a própria força e os reflexos, algo bem diferente do modo
narcisista como Raimi preferiu apresentar o Parker com poderes de Tobey
Maguire. No entanto, fica na memória a indefensável cena de videoclip com Peter brincando de skate.
Outro ponto positivo está na
escolha de Andrew Garfield como protagonista. Mais carismático que seu
antecessor, o jovem mantém um equilíbrio entre as cenas dramáticas que a vida
trágica de seu personagem com o humor ácido e escapista que ele possui. Até
mesmo a linguagem do adolescente é bem trabalhada. Repleta de gírias e tons de
insegurança, as falas do Parker de Garfield são construídas de forma pertinente
a um personagem que está lidando com muito mais que sua bagagem emocional pode
suportar. E é no bom humor que ele foca sua saída.
Boa química em cena: Emma Stone e Andrew Garfield |
Com a agradável comédia romântica
500 dias com ela no currículo, era de
se esperar que Webb trouxesse uma boa química ao romance entre o casal Peter e
Gwen. Os diálogos de ambos nos momentos em que começam a criar certa intimidade
são bem típicos da insegurança romântica dessa fase, tornando crível a construção
da história dos dois. Porém, no mesmo quesito crível, não é em todos os
aspectos que o diretor e roteiristas acertam. Apesar de se sair bem como o cientista
Connors, Rhys Ifans viu a escolha do vilão Lagarto como antagonista do
aracnídeo ser desperdiçada em uma caracterização digital falha, que não chega a
causar a suposta repugnância que a criatura almeja passar, tornando o vilão caricato,
sem o peso que o Dr. Octopus de Alfred Molina possuía no segundo filme de
Raimi. E a redenção do monstro não ajuda
em nada.
Ainda nesse aspecto de mau
desenvolvimento dos personagens, Martin Sheen e Sally Field fazem o que pode
para trazer peso e carisma aos tios Ben e Mary, tutores de Peter Parker. No
entanto, com o roteiro frouxo nesse âmbito da vida do futuro herói, nem mesmo o
assassinato do homem que o criou é bem desenvolvido pelo trio de roteiristas,
fazendo o acontecimento ter menos impacto que o merecido.
Como disse no começo do texto, o
filme possui mais erros que acertos. Estes fazem sua parte e tornam essa
reinauguração da franquia bem vinda. As cenas dos voos noturnos do aracnídeo
por Nova York (algo salientado de modo excelente pela fotografia de John
Schwartzman) e a previsão de ver na segunda parte dois um dos momentos mais
emblemáticos dos quadrinhos (algo trágico envolvendo Gwen Stacy e o Duende
Verde), torna O Espetacular Homem Aranha ainda
mais emblemático. Nada mal após a nociva e repugnante terceira parte da
franquia anterior.
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