(Brasil, 2012) Direção: Marcelo Gomes
e Cao Guimarães. Com Paulo André e Silvia Lourenço.
Por João Paulo Barreto
A solidão é o que move os
personagens de O Homem das Multidões. De
forma paradoxal ao seu título, Juvenal, seu protagonista, não faz parte de
nenhum vasto universo de pessoas. Vive solitário em sua rotina de operador de
trem, observando estações passarem estagnadas adiante do mesmo modo que sua
vida segue, paradoxalmente, inerte e em frente.
Introspectivo e sem traquejo
social, não tem muita naturalidade para conversar com colegas de trabalho,
mantendo-se em silêncio durante horários de almoço e sem conseguir dizer não a
um interesseiro que insiste em pedir-lhe uma constante troca de turno. Pragueja
sobre isso, em casa, ao tentar realizar uma faxina que parece nunca tornar
aquele ambiente menos sujo. Mas nunca cria a coragem para dizer o não
necessário para se afirmar.
Sua visão de mundo se altera um
pouco ao conhecer Margô, a coordenadora de trafego que controla sua linha. No
entanto, qualquer esperança que nutra no sentido de tê-la torna-se apenas um
devaneio diário. Noiva e sem o mesmo traquejo social que falta a ele, ela
derruba qualquer pretensão romântica sua ao convidá-lo para ser seu padrinho de
casamento sob o pretexto de não conhecer ninguém a quem fazer o mesmo
pedido. Claro, Juvenal ensaia sozinho uma negação ao pedido, mas, pouco tempo
depois, lá está ele, alugando um terno para a ocasião e trocando o par de
sapatos sociais pelos calçados do dia-a-dia de trabalho, numa brilhante alusão a
sua condição dependente ao seu meio de vida.
Juvenal em seu apartamento: solidão e desajuste |
Baseado em Poe, O Homem das Multidões é um filme que trata de desajustados. Pessoas
que passam pelo mundo sem qualquer intenção de desafiá-lo, seguindo apenas as
horas do dia ou sendo empurradas por elas. Juvenal ainda tenta ter uma vida,
pelo menos algo que, em sua visão, o distraia com algum norte. Mesmo que isso
signifique visitas a prostíbulos, exercícios físicos por conta de um possível interesse de Margô, e caminhadas a esmo por shoppings, subindo
escadas rolantes para, logo em seguida, descê-las.
Margô, ao passar seus dias a
observar apenas os monitores de segurança, encontra em Juvenal alguém com quem
compartilha seu silêncio e introspecção, apesar dos breves desabafos
relacionados ao trabalho. E é tocante como ela se identifica com o desajuste
deste, presenteando-o com copos novos quando este não podia lhe servir água
por possuir somente um em casa, ocasião
em que aceita de bom grado beber direto da garrafa.
Margô e Juvenal: silêncio confortável |
Contemplativa e pausada, é uma
obra que desafia o espectador e, ao mesmo tempo, o prende, cativando-o com uma
história simples, mas que, apresentando personagens tão extraordinariamente
comuns, acaba por se tornar de uma profundidade impar.
Em uma atualidade tão repleta de meios
urgentes e fugazes de comunicação, o silêncio atencioso entre duas pessoas em
um ambiente tende a se tornar, de fato, deslocado. Aqui, a naturalidade como
isso se apresenta é que o classifica como imprescindível para duas pessoas que
só encontram algum conforto quando estão na presença silenciosa e mútua.
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