Surpreendo Cláudio Marques com
uma rápida entrevista na abertura do Festival Varilux 2013. No meio da multidão
que se acumula no saguão do cinema, atropelo-o (enquanto ele degusta um
salgadinho do buffet de recepção) com
uma pergunta acerca do festival que o Espaço Itaú de Cinema – Glauber Rocha, local
onde ele atua como gestor e sócio proprietário, acolhe mais uma vez este ano.
Piadista, ele responde com grunhidos enquanto tenta saborear a iguaria que o
escriba chato aqui não o deixou aproveitar em paz. Mas, tudo bem. Após algumas
risadas (e meu receio de tê-lo feito engasgar), lá está o rapaz de voz calma,
sorriso largo e olhar reflexivo a me dar atenção da forma simpática de sempre.
Responsável pela ressurreição de um dos mais importantes espaços culturais de
Salvador, Cláudio é, juntamente com sua esposa Marília Hughes (que se juntou a
nós no papo alguns minutos depois), também o idealizador do Panorama Internacional
Coisa de Cinema, festival que, neste 2013, chega à sua nona edição. E este
também é o ano de DEPOIS DA CHUVA, primeiro longa metragem dirigido pela dupla
que já carrega uma vasta bagagem com curtas metragens e alguns Kikitos do
Festival de Gramado. E falando em festivais, esse ano o DEPOIS DA CHUVA foi
selecionado para exibição no Work in Progress, em Cannes. Nada mal para o
cinema baiano. No papo, os dois falam um pouco mais sobre essa experiência e
sobre uma das melhores novidades da cena cinéfila soteropolitana: a criação do
Cineclube Glauber Rocha. Confira!
Película Virtual - Cláudio, nova edição do Varilux acontecendo no
Glauber. Em relação ao ano passado, quando tivemos Intocáveis como filme de abertura, qual a sua expectativa para essa
nova edição?
Cláudio Marques – Uma coisa que me chamou muito a atenção esse ano
foi a inserção do Camille Claudel, 1915, filme
do Bruno Dumont. Ele é um dos cineastas que mais me chama a atenção. É um autor
de cinema. A cada filme, ele parece que vai trazer alguma coisa realmente nova.
Esse é um filme muito recente. Foi exibido há pouco tempo em Berlim. Após o
festival na Alemanha, eu realmente esperava que ele fosse demorar bastante para
chegar no Brasil. É um filme muito interessante. Talvez um pouco menos radical
do que os outros filmes dele, normalmente. Em relação até mesmo ao seu filme
anterior, o Hors Satan, que não foi
exibido no Brasil. Talvez o fato da Juliette Binoche estrelar o Camille Claudel tenha facilitado esse
lançamento por aqui.
Película Virtual – E a programação esse ano?
Cláudio Marques - Eu acho que esse ano ela está um pouco mais
ousada. Mesmo eu não conhecendo totalmente a programação, eu a acho um
pouquinho mais ousada, sim. Ano passado começamos com Intocáveis¸ o que demonstra uma preocupação comercial com o
publico, mas, ainda assim, eles também estão ousando e trazendo algumas coisas
mais autorais. Como cinéfilo, eu estou empolgado para conhecer os outros filmes
do festival.
Película Virtual – Você tocou
num ponto que eu estava pensando. Para mim, como cinéfilo, ver Salvador
entrando em um circuito de festivais como o atual, no qual temos o Varilux, o
Panorama, a Mostra Baiana, é bem recompensador. Para você, qual o próximo
passo?
Cláudio Marques – Eu estou bem feliz. Hoje, nós começamos a
divulgar o Cineclube Glauber Rocha. Esse projeto me deixa muito contente. O
cinema, normalmente, fica em uma ideia focada na adrenalina da novidade. No
lançamento, sabe? No que é sempre novo. E muitas vezes acaba acontecendo um
esquecimento de tudo o que foi produzido anteriormente, de tudo o que foi
feito. Essa lacuna é um problema. A
gente não pode ficar sempre na euforia da novidade. É interessante dar uma
estabilizada e pensar bem o que foi feito, o que foi produzido antes. Pensar
nos grandes filmes que foram importantes em determinado momento e o porquê deles
terem essa importância. Discutir um pouco essa produção que já foi. Somente
assim a gente vai entender melhor o que está vindo, o que está surgindo. E
muitas vezes, quando encaramos o que é novo como algo extremamente original,
não nota-se que, na verdade, aquela obra já bebeu de muitas outras fontes. Se
não tivermos essa consciência do que foi feito na história cinematográfica,
vamos acabar sendo enganados por não perceber outras influências que os filmes
atuais possuem. Não podemos cair nessa ignorância. Eu estou muito animado de
começar um cineclube, que é algo que já ocorre muito em cidades como São Paulo,
Brasília, Rio de Janeiro onde acontecem mostras de grandes diretores. No
entanto, essas são mostras muito caras. Nós não vamos conseguir trazê-las para
cá, mas o cineclube, a cada 15 dias, vai trazer algum filme que é muito
interessante e muito importante por algum motivo. E tem também o Panorama, que
vai ser no segundo semestre. Eu e Marília estamos viajando muito para festivais
nacionais e internacionais. A ideia é trazer muitos filmes para cá, também.
Película Virtual – E a expectativa para a exibição do Depois da Chuva no Work in Progress, em Cannes?
Cláudio Marques – Ah, essa aí a Marília pode responder (risos).
Marília Hughes – Olha, Cláudio já foi lá. Eu nunca fui. Vai ser
minha primeira vez em Cannes. E ainda por cima com um trabalho a ser exibido.
Isso é um privilégio absurdo (risos). Eu sei que é uma loucura. Muitos filmes,
muitas sessões, muita coisa acontecendo. É você se sentir no centro do mundo do
cinema. Onde tudo acontece.
Cláudio Marques – Sim. Cannes é intenso. Você acorda e, sei lá,
sete horas da manhã você já está em alguma fila para pegar a sessão de algum
filme na qual você vai encontrar e conversar com muitas pessoas. Após um dia de
muitas sessões, você vai dormir meia noite, completamente exausto, mas muito
satisfeito. É quase como carnaval (risos). As pessoas que gostam de carnaval
saem sem saber muito bem o que vai acontecer, o que vão encontrar. E aí, quando
termina, estão exaustas, mas com a sensação de que passaram por uma grande
experiência. Cannes tem essa mesma sensação.
Película Virtual – Mas esse ano você vai fazer parte desse carnaval
não só como público.
Cláudio Marques – Sim. Esse ano a gente tá com nosso filme lá. Ele
vai ser exibido em uma sessão especial que está sendo viabilizada graças ao
BAFICI (Buenos Aires Festival Internacional de Cine Independente), que é um dos
mais interessantes festivais do cinema independente mundial. O curioso é que se
trata de um festival argentino que está promovendo um filme brasileiro, algo
que é muito engraçado e estranho. É bacana que nós vamos estar lá em Cannes
dessa forma, exibindo um filme nosso que ainda não está pronto.
Marília Hughes - É um Work in Progress. O trabalho está quase pronto. A nossa
expectativa é que a sessão atinja distribuidores, agentes de venda,
programadores de festivais. A ideia é justamente essa. É fazer com que essas
pessoas possam se interessar pelo filme.
Cláudio Marques – Nós queremos ver quem vai se interessar. Como e
para quem o filme vai funcionar nessa sessão. É dessa forma que vamos descobrir
as possibilidades de exibição.
Película Virtual – Em que ponto está o Depois da Chuva? A versão exibida no BAFICI será a mesma de Cannes
ou haverá novas inclusões?
Cláudio Marques – A gente está sempre modificando o filme. Ainda
estamos trabalhando nele. É como diz o nome da sessão. É um Work in Progress, mesmo. No entanto, as
mudanças agora são pequenas e pontuais. Digamos que o filme está 98% pronto.
Claro que o som ainda não está pronto, não houve essa finalização ainda, mas,
falando da montagem, 98% estão prontos. Dessa montagem do corpo do filme, falta
pouca coisa. Agora, claro, esses dois por cento fazem uma diferença danada para
o resultado final do projeto.
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