(Brasil, 2011) Direção: Petrus Cariry.
Com Zezita Matos e Juliana Carvalho
Por João Paulo Barreto
A jovem filha volta para casa no
interior do Ceará na caçamba de um caminhão, portando apenas uma mala e uma
pequena caixa de papelão cujo peso não parece prejudicá-la em momento nenhum
para carregar. No entanto, a carga contida dentro daquela caixa possui o peso
mais descomunal do mundo. Algo que, para aquela mulher, representa toda dor e
sofrimento que um ser humano é capaz de sentir.
A idosa mãe a recebe da melhor
forma que uma mãe pode receber sua filha que há tempos não retorna para os
braços de sua família. A cidade com suas casas em ruínas e ruas desertas
representa justamente a desolação daqueles corações e a tristeza arrebatadora
de suas vidas. Nada pode curá-las daquela perda. O conteúdo daquela caixa de
papelão minúscula nunca as deixará em paz, por mais que uma delas tente se enganar
ao fingir que tudo está bem.
Mãe e Filha, filme de Petrus Cariry, é o tipo de obra que não
oferece redenção. Apenas dor e uma sensação de vazio ao se deixar a sala de
projeção. E é justamente por isso que ela é tão fascinante. O filme te absorve
como espectador. Ele te traz a mesma sensação de desespero que aquelas duas
mulheres, que aquelas duas gerações sentem. Com uma fotografia (dirigida pelo próprio
Cariry) que se baseia no contraste entre a escuridão e a parca força das luzes
de candeeiro e, também, no choque entre a luz natural do dia e a escuridão
interna do lar, o longa nos coloca inteiramente naquele universo. E, por pura
identificação àquele sofrimento inominável, não queremos deixá-lo ao ocaso.
Luz e sombras ilustram o mundo de dor daquelas mulheres |
Criando uma alegoria magnífica ao
inserir personagens simbólicos de vaqueiros como cobradores de algum débito sobrenatural
ou representantes do equilíbrio entre vida e morte (quatro cavaleiros do apocalipse?), Mãe e Filha ilustra de modo perfeito a confusão mental e desequilíbrio
que aquelas duas mulheres estão passando. As emoções das personagens são
escondidas atrás de um véu de ilusão. Enquanto a mãe refere-se ao neto como
alguém que lhe encherá o coração de alegria, vemos a filha buscar um falso
equilíbrio ao encarar aquela situação de modo pretensamente racional, como se
aquela dor fosse algo capaz de se lidar de forma consciente.
Cariry cria uma narrativa repleta
de silêncio. E o que é mais doloroso que a impossibilidade de se demonstrar seu
sofrimento? O silêncio da dor repreendida e a impossibilidade de dar vazão
aquela agonia da perda. Zezita Matos e Juliana Carvalho, nos papeis de mãe e
filha respectivamente, demonstram a dor de suas personagens de um modo cujo
sufocamento é quase palpável. Não carece de gritos e choros para percebermos
como a agonia daquela perda está machucando aqueles seres humanos. “Meu neto. É
como ser mãe de novo. Você vai encher meu coração de alegria”, diz a idosa mãe
enquanto segura o corpo minúsculo nos braços.
A dor da perda e a tentativa de suprimi-la enganando a si mesma |
Alguém disse antes que há uma
razão para não haver uma palavra que defina pais que perderam seus filhos, do
modo como estes podem ser chamados de órfãos quando os que os geraram se vão. A
razão é que a dor de perder um rebento é por demais dilacerante para que a
pessoa que a esteja sentindo tenha uma definição.
Mãe e Filha não é um filme para ser visto. É um filme para ser
sentido. O peso daquela caixa de papelão seria algo que eu, admito, não
conseguiria suportar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário