Impossível falar dessa nova
versão de O Vingador do Futuro sem
citar comparações com sua versão original, dirigida por Paul Verhoeven e
estrelada por Arnold Schwarzenegger em 1990. Enquanto no filme anterior a trama
envolvendo conspirações em Marte e rebeldes dissidentes esbanjava um apelo
moderno que, de tão tosco em relação à maquiagem dos alienígenas e mutantes, se
tornou cult no momento em que o filme
foi lançado.
Então, entrar na sala para assistir
a versão com Colin Farrell e dirigida por Len Wiseman (do divertido Duro de Matar 4.0) esperando algo que se
aproxime das cenas em que Schwarzenegger extraía um rastreador cerebral por
vias nasais ou aquela em que um mutante carrega uma espécie de bebê oráculo no
abdome não é muito recomendável. Ok, lá estará a mutante de três seios (em uma
cena totalmente deslocada) que referencia de forma gratuita o original, mas não
faz mais nada além disso.
O tal momento em que Quaid "desejaria ter três mãos" |
No entanto, em outros momentos, o
longa de Wiseman até que faz um bom trabalho ao lembrar a sua fonte de
inspiração de 22 anos atrás, como quando certo personagem derrama uma lágrima
no mesmo momento de tensão em que o original usou uma gota de suor ou quando o
herói tenta passar pela vigilância de um setor de embarque e, à frente dele,
está uma mulher praticamente idêntica ao disfarce utilizado por Schwazza na
versão anterior. No entanto, o que falta a essa nova aventura é a entrega ao
cinema de estilo, aquele que conseguiu unir a ficção científica de ação,
correria e tiroteios à aparência estilizada que Verhoeven soube criar tão bem.
Não é preciosismo, friso. Talvez o foco de Wiseman fosse a ação veloz (algo já previsível
após vê-lo transformar John McClane em superpolicial), mas chega um momento em
que, após tanta correria, o espectador começa a se perguntar do que o herói
está fugindo.
Em Total Recall versão 2012, o planeta Terra está dividido em apenas
dois territórios: a Colônia, localizada na Austrália e lar dos operários que
mantém o funcionamento da Federação da Bretanha, Inglaterra, local para onde
eles precisam viajar diariamente através do núcleo da Terra (uma cena muito bem
construída, apesar de absurda). Todo o resto está inabitável por conta das
guerras. Douglas Quaid (Farrel) é o ex-rebelde desmemoriado que passa os dias
se perguntando o que há de errado com sua rotina. O herói dessa versão trabalha
não portando uma britadeira, mas como operador de uma linha de montagem de robôs.
Casado com uma mulher linda mulher (Kate Beckinsale, esposa do diretor
Wiseman), Quaid tem recorrentes sonhos onde é perseguido pela polícia e, na
busca de um escapismo, procura a Rekall, empresa que supostamente lhe dará
memórias de aventuras como agente secreto. Quando algo no procedimento
científico dá errado e seu passado de rebelião vem à tona, a correria começa e
só termina no último minuto do filme.
Hora de fazer valer o "até que a morte os separe" |
Perseguido por todos, inclusive
pela sua suposta esposa, o homem corre por ruelas estreitas e úmidas que
misturam culturas orientais com ocidentais em uma eficiente referência à Blade Runner (o roteiro de Kurt Wimmer e
Mark Bomback é inspirado em uma história de Philip K. Dick, que também escreveu
o livro origem para o filme de Ridley Scott). Em certos momentos, confesso que
fiquei esperando que a trilha de Harry Gregson-Williams fizesse alguma
referencia a Vangelis. Durante boa parte da história, as dúvidas quanto à
natureza real de toda aquela perseguição são levantadas, mas, claro, qualquer
tentativa de fazer valer esse suspense se perdia, bastando lembrar-se da
história original. Talvez até funcione com quem não viu a primeira versão, mas
eu duvido.
Modificando o plot do filme de
1990 e o mantendo longe do contexto espacial, O Vingador do Futuro consegue se atualizar ao criar uma metáfora
que ilustra bem a paranoia do homem moderno sempre descontente com o que tem e
se perguntando o que poderia ser diferente em sua vida. E é justamente isso que
o diferencia do longa de 1990: aqui, infelizmente, não há o estilo e exploração
de corpos proposto por Verhoeven. No entanto, ao manter a abordagem fora do
contexto alienígena, o filme de Wiseman acaba por criar uma história que,
apesar de viver à sombra de seu predecessor, caminha (ou corre – e muito) com
as próprias pernas.
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